Mais do que fazer piada da bizarrice que é a televisão, "Welcome To Me" é o melancólico retrato de uma sociedade que aprendeu a revelar tanto sobre a própria rotina que passou a encená-la.
por Fernando Labanca
Seria cômico se não fosse tão trágico. Essa frase sintetiza bem o que é este filme, que mescla humor, uma boa dose de vergonha alheia e um constante clima melancólico. "Bem-Vindos ao Meu Mundo" é, também, o trabalho que mais exigiu da atuação de Kristen Wiig, que longe do palco cômico do SNL, busca reconhecimento como atriz e este, definitivamente, é seu melhor momento, ela é a alma de tudo isso. Aqui, Wiig dá vida a Alice Klieg, uma mulher solitária que sofre de transtorno bipolar e que vê sua rotina se transformar quando ganha na loteria. Grande apreciadora dos ensinamentos de Oprah, Alice acredita que o dinheiro lhe trará a chance de brilhar, de finalmente estar no holofote e para isso acontecer, ela entra em contato com uma emissora de TV decadente, oferecendo milhões para ter seu próprio programa, com roteiro, direção e produção feitos por ela mesma.
Há algo de "O Show de Truman" aqui e aquela estranha curiosidade pela vida alheia, mesmo que sendo uma realidade simulada. Existe, principalmente, a estranheza de "Sinédoque, Nova York" - a obra mais conturbada e mais autoral de Charlie Kaufman - presente em suas criações, neste egocentrismo da protagonista, que reformula, diante dos outros, como um produto a ser vendido, a própria vida. E que o faz para compreender sua existência, entender o que antes era confuso, reviver para dizer o que não havia dito. Mesmo que jamais alcance o brilhantismo das obras citadas, "Welcome To Me" tem seu valor. Diferente delas, também, temos uma forte protagonista feminina, insana, exagerada e extremamente interessante, que realiza bizarrices diante de nossos olhos, que nos faz rir de improváveis situações. Não encaro o roteiro como um estudo sério sobre sua doença, a bipolaridade é apenas um pequeno detalhe que justifica as ações impensadas de Alice. No geral, é um texto divertido, inusitado, original, que brinca naturalmente com o absurdo. O programa de auditório criado é simplesmente hilário, que acaba por fazer sátira ao que encontramos na TV e neste fascínio que a audiência encontra na tragédia do próximo.
Acredito, no entanto, que o longa evita alcançar voos mais distantes, parece limitado mesmo com uma ideia tão boa em mãos. É, ainda assim, extremamente genial, mas ficamos a espera de algo a mais, e esta grandiosidade e loucura que o roteiro permitia nunca chega. Faltou mais inspiração na direção de Shira Piven, que entrega um produto mais simples do que poderia ter sido. Sinto isso, principalmente pela força de Kristen Wiig como atriz. É nítido que ela aguentaria ir muito mais além e que ela merecia uma trama ainda mais absurda e mais conflituosa. Gostei muito de sua atuação e se há alguns anos atrás eu me perguntava o porquê dela não protagonizar filmes era por que eu sentia que era aqui que ela poderia chegar e ela pode ainda mais. O restante do elenco é ótimo também, da ternura da sempre versátil Linda Cardelline ao olhar triste de Wes Bentley. Thomas Mann, Joan Cusack e James Marsden não decepcionam e para completar, uma Jennifer Jason Leigh desperdiçada.
"Bem-vindos ao Meu Mundo" faz uma interessante analogia ao vazio presente no mundo de hoje. Confesso que depois que vi o filme, o enxergo com facilidade a cada vez que me aventuro pelas redes sociais. Algumas pessoas se colocam nessa posição, criam o próprio show, uma vitrine aberta de suas conquistas ou de tudo aquilo que elas querem que os outros saibam sobre sucesso, de tudo aquilo que sua simples rotina mereça ser vista. Há um momento em que o público é obrigado a ver, por longos minutos, Alice Klieg comendo um pedaço de bolo ao vivo. É uma cena estúpida e seria inútil se ela não fosse tão reveladora. Sim, a obra tem seus erros, mas quando me deixou estático enquanto seus créditos finais desciam percebi o quanto fui atraído por sua estranha trama, por sua deliciosa insanidade. Vale uma conferida, sem dúvidas.
NOTA: 7,5
País de origem: EUA
Duração: 105 minutos
Distribuidor: Universal Pictures
Diretor: Shira Piven
Roteiro: Eliot Laurence
Elenco: Kristen Wiig, Wes Bentley, Linda Cardelline, James Marsden, Joan Cusack, Thomas Mann, Tim Robbins, Jennifer Jason Leigh
Arrazô na crítica. O filme não é brilhante, mas é uma super crítica recheada de momentos hilários e uma atuação irretocável da protagonista.
ResponderExcluirValeu!!! Muito obrigado!
ExcluirE sim...o filme vale pelas críticas que faz e pela atuação dela
Não, o filme é absurdamente semelhante à realidade de quem tem transtorno de personalidade borderline (que nada tem a ver com bipolaridade). Só entendeu o filme de verdade quem realmente estuda o transtorno. O filme é incrivel, até o abandono do terapeuta é a realidade do transtorno, ninguém aguenta os borders, o egoismo patologico esta muito bem retratado, não existe o outro para eles. É um transtorno egoico. A maneira como o border envolve as pessoas e transforma os ambientes. Para mim nota 10.
ResponderExcluirNão acho que só quem estuda o transtorno vai entender o filme. Não faria nem sentido fazê-lo. Na minha visão, "Bem-vindos ao Meu Mundo" é uma obra de comédia, que tem como intuito, entreter, sem deixar de ter boas sacadas e ser inteligente. Ainda acredito que não há uma intenção do roteiro em ser um estudo profundo sobre a doença.
ExcluirAcho que quem não estuda o transtorno, vai entender como algo hilario como varios colocaram aqui, com boas sacadas e inteligente como vc mesmo colocou, mas quem estuda enxerga de outra maneira. O abandono da medicação anti psicótica, todo border faz isso, o ego, a ausencia de obediencia à lei, no mundo deles isso não existe, pois é um transtorno que remete a infancia. Amei o filme, nunca vi esse transtorno tão bem retratado. Eles são fora da casinha daquele jeito mesmo.E estão misturados à multidão. Para mim o filme merece 10, e com louvor.
ExcluirQue pesado! “ Ninguém aguenta os borders”. Você realmente estuda o transtorno? Conheço muitos borders bem sucedidos e que tem um ótimo ciclo de amizade e familiar. A psicofobia começou com essa frase.
ExcluirFoi o melhor filme sobre o assunto que assisti até hoje, colocou no bolso garota interrompida. Uma injustiça dar 7,5 e dizer que é sobre bipolaridade. Creio que o cineasta teve que estudar muito p chegar nessa formula. Recomendei para amigas que são psicólogas.
ResponderExcluirdei boas gargalhadas!
ResponderExcluira gente sabe q vai dar merda, e dá mesmo! a atriz faz um trabalho excelente!
tb fiqueifiquei olhando os créditos no final e me intrigaram: dailies, digital intermediate, avids...
Sim! Achei engraçado também, além de ter gostado muito do trabalho da atriz.
ExcluirO filme retrata uma personagem com transtorno de personalidade borderline. E não entendo qual o Graça do filme se não for para observar isso.
ResponderExcluirNão se trata de bipolaridade, mas do transtorno de personalidade borderline, e isso é dito diversas vezes no filme, claro até mesmo para quem não conhece a doença. Recomendo maior atenção à trama antes de dar um 7,5 como nota, sem sequer entender de fato do que se trata - Bipolar é MUITO diferente de Borderline .
ResponderExcluirVendo alguns comentários aqui, vi que cometi um erro grosseiro no texto, acabei escrevendo que a protagonista é bipolar e não citei seu transtorno de personalidade boderline. Conheço muito pouco sobre o assunto e realmente não sabia que se tratavam de coisas diferentes. Neste sentido, agradeço os comentários me alertando sobre isso.
ResponderExcluirMas de qualquer forma, não mudaria a nota do filme, não vejo 7,5 como nota baixa e quem ler a crítica completa verá que fiz muitos elogios sim. E sabendo ou não sobre a doença, não posso ignorar os defeitos do filme também.
Mas durante o filme é falado que ela fora diagnosticada primeiramente com transtorno bipolar e depois border. Essa confusão entre diagnosticos há até no meio de quem estuda.
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