segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Oscar 2013 - Os Vencedores



 por Fernando Labanca

A cerimônia do Oscar aconteceu neste domingo, 24 de fevereiro, e consagrou, assim como se esperava o filme de Ben Affleck, "Argo", que levou para casa os prêmios de Melhor Filme, Roteiro Adaptado e Edição. Outro grande destaque foi "As Aventuras de Pi", vencendo em quatro categorias, Diretor para Ang Lee, Trilha Sonora, Efeitos Visuais e Fotografia. 

O favorito do ano "Lincoln" saiu apenas com dois prêmios, aquele que todos já sabiam, de Melhor Ator para Daniel Day-Lewis, o terceiro de sua carreira, o que já é um recorde, e Direção de Arte. Ver este novo trabalho de Steven Spielberg perdendo em tantas categorias é a prova de que algo mudou na Academia, se antes era tão óbvio ver o favorito ganhando em todas as suas indicações, desta vez, houve um senso maior, não houve o "grande vencedor da noite", foi uma premiação justa, como há muito não acontecia. Repararam o erro de não colocar Ben Affleck como diretor lhe entregando o de Melhor Filme, que de fato, muito mereceu, pois era, definitivamente, o melhor dentre os indicados. Premiaram o melhor dentre os diretores, ignorando o favorito Spielberg e entregando o troféu para aquele que realizou uma das obras mais fantásticas do ano passado, Ang Lee. Títulos como "Django Livre", "007-Operação Skyfall" e "O Lado Bom da Vida", também tiveram seus momentos e mereceram os prêmios que levaram. A meu ver, o grande erro da noite, foi na categoria de Longa-metragem de animação, que premiou "Valente", havia concorrentes melhores como "Detona Ralph" e "ParaNorman".

Houve aqueles momentos vergonhosos, como sempre. Não, o tombo de Jennifer Lawrence não conta, nunca vi ninguém caindo com tanta classe como ela. Achei bizarra a aparição de Barbra Streisend, que fez um tributo aos artistas que morreram, mais esticada impossível. Acho bem triste ver essas atrizes que não aceitam a idade que tem. Outro caso ainda mais bizarro foi Renée Zellweger, a atriz surgiu no palco ao lado de seus colegas de elenco do filme "Chicago" e mal conseguia abrir os olhos ou falar o nome dos vencedores. Por falar no filme, que este ano comemora dez anos desde seu lançamento, a atriz Catherine Zeta-Jones realizou um número musical bastante interessante. Aliás, a cerimônia parece que resolveu apostar suas fichas nos musicais, onde o incrível elenco de "Os Miseráveis" fizeram uma belíssima performance com a música indicada na categoria Canção Original, além do momento "x" da noite, onde a esquecida Jennifer Hudson cantou uma canção do musical "Dreamgirls". Vale claro citar um dos momentos mais incríveis que foi ver Adele cantando "Skyfall", música na qual levou seu Oscar, por incrível que pareça, o primeiro da série 007 por esta categoria.

Não acredito que houve muitas surpresas, a maior mesmo foi Ang Lee e seu prêmio de Melhor Diretor, ou o inusitado empate na categoria Edição de Som. Mesmo sem as surpresas, confesso que fiquei bem feliz com os resultados, foi tudo muito justo, o que quase nunca acontece no Oscar. Vamos aos vencedores...



MELHOR FILME
Argo


MELHOR DIRETOR
Ang Lee (As Aventuras de Pi)


MELHOR ATRIZ
Jennifer Lawrence (O Lado Bom da Vida)


MELHOR ATOR
Daniel Day-Lewis (Lincoln)


MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Anne Hathaway (Os Miseráveis)


MELHOR ATOR COADJUVANTE
Christoph Waltz (Django Livre)


MELHOR FILME ESTRANGEIRO
Amor (Áustria)


MELHOR ANIMAÇÃO
Valente


MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
Quentin Tarantino (Django Livre)


MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
Chris Terrio (Argo)


MELHOR TRILHA SONORA
Mychael Danna (As Aventuras de Pi)


MELHOR CANÇÃO ORIGINAL
Skyfall - Adele (007 - Operação Skyfall)


MELHOR FOTOGRAFIA
As Aventuras de Pi


MELHOR DIREÇÃO DE ARTE
Lincoln


MELHOR MAQUIAGEM
Os Miseráveis


MELHOR FIGURINO
Anna Karenina


MELHOR EFEITOS ESPECIAIS
As Aventuras de Pi


MELHOR EDIÇÃO DE SOM
007 - Operação Skyfall
A Hora Mais Escura


MELHOR MIXAGEM DE SOM
Os Miseráveis


MELHOR EDIÇÃO
Argo


MELHOR CURTA-METRAGEM
Curfew


MELHOR DOCUMENTÁRIO
Searching for Sugar Man


MELHOR DOCUMENTÁRIO (curta-metragem)
Inocente


MELHOR ANIMAÇÃO (curta-metragem)
Paperman


sábado, 23 de fevereiro de 2013

Crítica: Os Miseráveis (Les Misérables, 2012)

Mais um indicado na categoria Melhor Filme no Oscar 2013, "Os Miseráveis" é uma adaptação do musical da Broadway baseada na clássica obra de Victor Hugo. Com direção de Tom Hooper (O Discurso do Rei), o filme acompanha, através de canções, o drama de diversos personagens durante a Revolução Francesa. Com visual impecável, vemos um bom momento na carreira de Hugh Jackman e Anne Hathaway.

por Fernando Labanca

Revolução Francesa, século XIX. Conhecemos a miséria de Jean Valjean (Jackman) que por roubar um pão vai preso, no entanto, ao ganhar sua liberdade, passa a ser perseguido pelo policial Javert (Russell Crowe). Anos depois, com outra identidade e uma nova vida, Jean se depara com a miséria de Fantine (Hathaway), uma mulher que entrega seu corpo e sua alma para ganhar dinheiro e assim sustentar sua pequena filha, Cosette, que por sua vez, vive com os trambiqueiros Thénardier (Helena Bonham Carter e Sacha Baron Cohen). Com a promessa de salvar a garota, Jean inicia um novo rumo a sua vida, amando e cuidando de Cosette, que muito tempo depois, já crescida (Amanda Seyfried), se apaixona por um revolucionário (Eddie Redmayne), que tem seu coração dividido entre a paixão pela bela moça e a luta em nome de sua nação.

Apesar de ser uma grande produção, "Os Miseráveis" pode muito bem ser considerado um filme experimental, isso porque a ousadia de Tom Hooper coloca seus atores cantando ao vivo nas gravações, dando maior realismo para suas expressões, mostrando uma força e coragem de um elenco que poucas vezes se viu em um musical. Aliás, fazia muito tempo que não víamos um musical tão grandioso como este, talvez, desde "Chicago". É tudo muito grande, o esforço nítido dos atores, a composição dos cenários, o cuidado com os figurinos e com todo o visual que surge em perfeito estado. Tom Hooper, por sua vez, parece querer levar ao pé da letra a adaptação teatral para o cinema, onde a impressão que fica é que nem mesmo ele compreendeu a grandeza de seu projeto e as grandes proporções que sua obra poderia alcançar, sua câmera parece não entender que isso é cinema, não mais teatro, seu realismo passa a ser forçado e o que poderia ter sido maior, como as sequências da revolução ao ar livre, surge pequeno, é como se houvesse um universo enorme nas mãos dele, porém, nem sempre ele transmite da melhor forma.


O roteiro assinado por William Nicholson, já acostumado com obras de época, ele que escreveu "O Gladiador" e "Elizabeth - A Era de Ouro", retorna na difícil missão de levar um musical para as telas. Vemos a miséria sob diversas perspectivas, seja daquele homem infeliz e vazio que tenta se redimir através do amor da filha que o destino lhe deu, seja daquela mulher que se prostituiu para salvar aquela que amava, ainda vemos o casal de oportunistas que encontram na trapaça e no roubo a única maneira de sobreviver, ou aquela jovem garota pobre que encontra no amor o único sentido para sua vida. Em seu roteiro, não é nítido, mas há diversos capítulos, alguns personagens tem seu início, meio e fim em poucos minutos, como é o caso de Fantine. O ponto de partida é a libertação de Jean Valjean e toda a sua trajetória vai dando vida a outros indivíduos, e a meu ver, isso foi um grande acerto, pois todos os personagens tem seu espaço, são bem desenvolvidos, onde cada um tem sua importância na trama. O problema de haver essas "subtramas" é que durante todo o filme, e eu estou falando de duas horas e meia de filme, como uma amiga minha disse e gostei de seu termo, há uma quantidade exagerada de "ápices dramáticos", ao seu final, já não mais aguentava tanto drama, tanto sofrimento de tantos personagens. O problema fica maior ainda quando todos esses intermináveis conflitos são cantados, é preciso dizer que gosto de musicais e não é de hoje que admiro este gênero, mas "Os Miseráveis" foi muito além do tom ideal, as canções extremamente melancólicas fazem deste longa jornada uma experiência ainda mais cansativa e maçante, se os dramas já são pesados, ficam ainda mais quando estes são cantados pelas vozes sofridas de seu elenco.

A sorte deste musical é que seu elenco é bastante corajoso. Não consigo entender esta surpresa das pessoas sobre a atuação de Hugh Jackman, é com certeza, o melhor momento de sua carreira, finalmente se consagra como ator, no entanto, este não é seu primeiro bom trabalho, quem viu obras como "O Grande Truque" de Christopher Nolan e "Fonte da Vida" de Darren Aronofsky, sabe muito bem disso. Jackman é o grande destaque deste musical, apesar de não cantar tão bem e desafinar constantemente com seus diálogos cantados, seu esforço como ator impressiona, se joga inteiramente neste difícil personagem. Anne Hathaway, é claro, é outro bom destaque onde já era assunto antes mesmo do filme lançar, sua magreza, seus cabelos raspados, a dor de sua voz e o sofrimento de seus olhos e suas expressões emocionam de forma intensa e seu memorável número musical "I Dreamed a Dream" é aquele que fica na nossa cabeça assim que o longa termina. Já Russell Crowe surpreende de tão ruim, além de cantar mal, o ator faz questão de não se expressar durante todo o filme, para piorar, seu personagem é o que há de pior neste musical, numa perseguição sem graça e insistente com o protagonista Jean Valjean. Helena Bonham Carter e Sacha Baron Cohen estão bem em cena, são o alívio cômico no meio de toda a desgraça do roteiro e assim acabam salvando diversas sequências, é o ânimo no meio do sofrimento, o que é muito bom. Do restante do elenco, temos a novata no cinema Samantha Barks, jovem, porém é uma das grandes vozes do musical e a bela Amanda Seyfried e Eddie Redmayne que também estão ótimos. Sim, claro, a verdade é que não há nenhum grande cantor nesta produção, há muita desafinação e isso prejudica diversas cenas, no entanto, como disse anteriormente, é nítido o esforço de todos em cantar, vale por ver grandes atores se entregando desta forma, não recomendo sua trilha sonora, mas na tela, apesar dos erros, tudo é mais belo quando há ótimas atuações por trás das canções. 

"Os Miseráveis" provavelmente será lembrado entre os bons exemplos de musicais no cinema. Não é meu preferido e sinceramente esperava muito mais dele, porém sua beleza é inquestionável, toda a equipe deste filme, seu diretor e seus atores fazem de tudo para o melhor e isso é admirável, ver o esforço de muito trabalho, ver o quanto é um projeto arriscado, por ser tudo muito grande, muito ousado, ver o respeito do roteiro para com a obra original, tudo isso conta e fazem deste longa um musical de grande qualidade e que merece ser apreciado. Confesso que me cansou, duas horas e meia de pessoas cantando sem intervalos numa história pesada e com uma carga dramática muito acima do aceitável, este é o "Os Miseráveis" que tem emocionado muita gente, mas com certeza não é para todo o tipo de público. Gostei, é belo e muito bem realizado, e mesmo com suas falhas, Tom Hooper prova, mais uma vez, ser um diretor competente, que arrisca, que procura soluções nada fáceis, e mesmo com seus exageros, emociona.

NOTA: 8



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Crítica: O Mestre (The Master, 2012)

Vencedor do Leão de Prata de Melhor Diretor no último Festival de Veneza e indicado ao Oscar 2013 nas categorias de Melhor Ator, Ator Coadjuvante e Atriz Coadjuvante, para Joaquin Phoenix, Philip Seymour Hoffman e Amy Adams, respectivamente. Já era polêmica muito antes de ser lançado por ter sua trama inspirada na Cientologia, o que acabou decepcionando alguns que esperavam maiores conclusões sobre o controverso assunto. "O Mestre" marca o retorno de Paul Thomas Anderson, um dos melhores diretores da atualidade, além de ter a memorável interpretação de Joaquin Phoenix, sem sombra de dúvida, a melhor atuação masculina dos últimos anos.

por Fernando Labanca

Assim que a Segunda Guerra Mundial termina, o marinheiro Freddie Quell (Phoenix) tenta voltar a vida normal trabalhando como fotógrafo. Um homem com sérios problemas emocionais, conturbado pelos acontecimentos da Guerra, atordoado pela própria vida, onde nunca encontrou um verdadeiro sentido para ela, tem uma incontrolável ansiedade sexual e surtos de ira e violência. Perambulando pelas ruas da cidade, como de costume, alcoolizado, Quell se depara com Lancaster Dodd (Hoffman), um homem inteligente e carismático que lhe oferece abrigo. Mais do que um lugar para ficar, Dodd ao perceber o quão problemático é o misterioso homem, o usa como cobaia de seu novo estudo, ele que escreveu "A Causa", livro que guia uma doutrina religiosa e que tem milhares de fervorosos seguidores, tenta salvá-lo, dominando sua mente, numa ideologia que acredita que a procura de vidas passadas é a cura para doenças atuais, é o caminho para o controle e libertação da alma.


"Se descobrir um modo de viver sem servir a um mestre, qualquer mestre, então nos conte como conseguiu. Você seria a primeira pessoa na história do mundo". Frase dita por Dodd a seu pupilo, Freddie, ao perceber que ele já estava muito distante de seus ensinamentos. "O Mestre", que tem seu roteiro assinado também por Paul Thomas Anderson, trás grandes reflexões sobre como uma sociedade parece não conseguir progredir sem seguir uma ordem superior, sem ter alguém guiando seus passos, como é tão mais fácil sentir ter a permissão de uma doutrina, usá-la como desculpa para suas ações. A trama acompanha uma época onde seus personagens enfrentam o vazio deixado pela Guerra, mais do que isso, o declínio daquele tão sonhado "american way of life", onde "A Causa", claramente inspirada na Cientologia, revela ensinamentos tão absurdos mas que de alguma forma preenche o vazio daquelas almas. Freddie Quell, que demonstra ter por Dodd um sentimento fraternal, permite ser moldado às normas de "A Causa", deixando ter sua mente controlada, pois seus vícios e sua loucura eram vistos como doença, algo a ser curado. 
  
Ao ver "O Mestre", muitos poderão encontrar razões para odiá-lo, o filme tem um formato diferente do que geralmente vemos, Paul Thomas Anderson não se preocupa em criar uma obra para ser agradável, é, assim como todos os seus trabalhos anteriores, um projeto pessoal, que foge do casual, ele cria um universo novo incapaz de ser comparado a qualquer outra coisa, por isso é tão difícil descrevê-lo, encontrar um sentido, uma razão para todas aquelas cenas. Se para muitos, sua trama se aprofundaria nos primórdios da Cientologia, PTA logo nos prova que sua intenção era bem outra, longe de querer ser polêmico ou ofender alguém, longe de querer encontrar lógica para a religião, "O Mestre" é uma obra extremamente complexa, subjetiva, que poderá ter inúmeras definições e interpretações. Para algumas pessoas, certamente, será um longo filme sobre absolutamente nada. Vi algo a mais, vi um belo filme sobre a jornada deste memorável personagem, Freddie Quell, sobre o vazio da sua vida, sobre sua busca insistente de querer encontrar um sentido para ela. Seja pelo o que ele viu da Guerra, seja por um amor não concluído, nunca conseguimos encontrar as razões para sua loucura, sua raiva, seu alcoolismo. É então que surge esta relação dele com Lancaster, que de início parece ser uma relação de interesses, logo se mostra uma amizade de grande intensidade, ambos acabam revelando a verdade sobre um ao outro, parece que conhecemos a fragilidade de Quell quando este está com Dodd, ao mesmo tempo em que podemos observar o lado mais sombrio e monstruoso do tal mestre. É simplesmente belo o olhar de Freddie para seu amigo, um olhar que pede ajuda, compaixão, um homem que não se adequa a sua religião, mas permanece pois acredita que seu mentor e amigo poderá encontrar a razão para suas dores, poderá preencher o vazio de sua vida fracassada. 

São raras as vezes que nos deparamos com obras como esta, Paul Thomas Anderson que já havia feito trabalhos fantásticos como "Megnólia" de 1999 e "Sangue Negro" de 2007, já não havia nada para provar, ele é um dos melhores diretores do cinema atual e percebemos isso a cada cena, a cada minuto sentimos um grande prazer, prazer porque são por filmes como este que se vale a pena admirar a sétima arte, ser cinéfilo, por ter a certeza de que há alguém, ainda, capaz de realizar um trabalho tão primoroso e tão completo quanto "O Mestre". A maneira como captura cada imagem é única, há beleza em todas as sequências, seja sua direção com os atores que consegue expor o melhor de cada um, seja nas belíssimas paisagens, com fotografia impecável, o jeito único de PTA de reúnir todos estes elementos e construir algo hipnotizante, mesmo quando nada acontece. Vale citar a incrível trilha sonora composta por Jonny Greenwood, músico da banda "Radiohead", que conversa bem com as cenas, conseguindo transmitir toda a confusão daquele universo, revelando com competência o lado enigmático e doentio dos personagens. 

Joaquin Phoenix. O que dizer deste ator? Simplesmente fiquei arrepiado com seu desempenho, desde a interpretação de Daniel Day-Lewis em "Sangue Negro",  não via nada tão magnífico no cinema, é digno de palmas, tem poucas chances no Oscar, no entanto, não só é a melhor atuação do ano, como a melhor atuação masculina em anos. Phoenix faz de Freddie Quell um personagem único, memorável, surge com sua forma física tão monstruosa quanto seu interior, seu olhar é tão profundo, seu sorriso que revela seu lado mais inocente, quase que de uma criança, que pede por ajuda. Enfim, foram poucas as vezes que vi uma atuação tão incrível quanto a deste ator. Os coadjuvantes também são de peso, Philip Seymour Hoffman surge magnífico, realiza cenas antológicas ao lado de Phoenix, mesmo que cenas simples como o jogo de perguntas e respostas, provam o quão grandiosos são estes dois atores. Amy Adams, que mesmo sem perder sua doçura, aparece como nunca a vimos antes, com um olhar forte e uma voz mais segura, domina o texto, e prova seu talento ao conseguir atuar ao lado de dois monstros do cinema sem ser ofuscada. 

Ver e apreciar "O Mestre" é uma experiência única, é uma verdadeira aula de como se fazer um bom filme. Paul Thomas Anderson é um gênio. Uma direção que se atenta aos detalhes, construindo cenas que permanecem na memória muito tempo depois de ter terminado. Com seu roteiro, vemos na tela o desenvolver de grandes personagens, complexos, que transitam entre o medo e a loucura, do sensível ao violento, agressivo. Há um sentimento muito forte preso na trama, por vezes sentia que havia uma bomba prestes a explodir, há algo de monstruoso e enigmático presente em cada sequência, parece que vamos adentrando um universo sombrio e nos sentimos tão atordoados quanto os personagens ali retratados, por fim, me senti vendo um verdadeiro terror psicológico. Intrigante, assustador, belo e inspirador, "O Mestre" é a mais nova obra-prima de Paul Thomas Anderson. Provavelmente não levará nenhum Oscar este ano, mas é nitidamente superior a muitos dos indicados. Recomendo. 

NOTA: 9



sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Crítica: Lincoln (Lincoln, 2012)

O filme com maior número de indicações ao Oscar este ano, totalizando 12, incluindo Melhor Filme e Melhor Diretor, "Lincoln" é um drama político dirigido por Steven Spielberg, que tem como foco os últimos atos de Abraham Lincoln como presidente, onde suas conquistas mudaram o rumo das gerações futuras. Lento e extremamente didático, este é, com certeza, um dos filmes menos audaciosos de Spielberg, que chega aos cinemas apenas para provar seu patriotismo.

por Fernando Labanca

Para quem espera se deparar com a biografia do ex-presidente Abraham Lincoln, este não é o lugar certo. O roteiro assinado por Tony Kushner, com quem Spielberg trabalhou em Munique (2005), relata em suas duas horas e meia os últimos meses de Lincoln, tanto no comando dos Estados Unidos, como os de sua vida. Mais precisamente em 1865, quando o país se dividia na violenta Guerra Civil, o presidente além de se preocupar com estes acontecimentos tinha um plano muito maior em mente, levar adiante uma emenda que proclamava a libertação dos escravos, nem que para isso, ele precisasse adiar o fim das batalhas. Tentando convencer os homens de seu próprio partido, Lincoln ainda teve que correr atrás do maior número de aliados possível, os do partido Democrata, se utilizando de alguns "favores políticos" além de seus longos discursos revolucionários, para que tivesse mais votos no Congresso. 


Por mais que os bastidores da política sejam o grande alvo desta nova produção de Steven Spielberg, o longa acaba ganhando força ao tentar humanizar o ex-presidente, seja como pai ausente de seu filho mais velho, interpretado com competência por Joseph Gordon-Levitt, seja como fiel parceiro de sua esposa (Sally Field), que após perder um filho, enfrenta uma grande instabilidade emocional. Por trás desta figura icônica, há um homem, um ser capaz de cometer erros, e em suas expressões vemos a dor de quem viu, enfrentou e lutou por muita coisa. No entanto, é na política que o filme acaba focando mais e assim, digamos, se torna um filme nem tão interessante de se ver, há diálogos intermináveis, discussões, debates, mostradas, às vezes, em cenários claustrofóbicos, fechados e com pouca luz, bem distante do cinema que conhecemos de Spielberg, aquele diretor grandioso que sempre evitou trabalhos menores, é um filme mais intimista, menos exagerado e infelizmente, com menos impacto e menos emoção. Parece não haver intenção alguma de se fazer uma obra para o público, para ser admirada, comentada, como disse anteriormente, é sem sombra de dúvida, o filme mais ordinário do diretor, menos audacioso, tradicional e quadrado, parece ter sido feito para a TV ou para alguma aula de história, não que fosse agradar aos alunos.

Há, porém, todo um cuidado com a produção, cenários, figurinos e trilha sonora, assinado pelo compositor John Williams, não há nenhuma canção tema marcante, e apesar de tímida, funciona bem durante todo o filme. Antes mesmo de se ver "Lincoln", é nítido que o grande destaque é seu ator principal, Daniel Day-Lewis, pronto e na medida para seu próximo Oscar, ele é, com certeza, a melhor coisa de toda a obra. É simplesmente inacreditável seu talento em se transformar em cada filme que faz, não há nada na composição de seu personagem que me lembrasse de alguma outra atuação em sua carreira, faz de Lincoln um grande protagonista, um personagem forte, talvez mais forte do que o roteiro pretendia. Os coadjuvantes são bons, nomes como Joseph Gordon-Levitt, David Strathairn, John Hawkes, Jackie Earle Haley, Hal Holbrook e Lee Pace, todos ótimos. Os indicados ao Oscar, Sally Field e Tommy Lee Jones, ao meu ver, não são tão merecedores do prêmio. Ela, surge teatralmente forçada, uma característica que Field não tem é naturalidade e isso prejudica suas cenas. Já Tommy Lee Jones é ótimo, admito, mas o papel do velho extremamente sério e rabugento e de opinião forte não é novidade para o ator, faz isso quase sempre, na verdade. No entanto, com tantos atores bons no elenco, ninguém, além de Day-Lewis, tem espaço para desenvolver bem um personagem, são meros obstáculos ou simplesmente pessoas com quem ele convive, sem mais profundidades.

O público brasileiro tem ainda menos chance de se envolver na trama, é sobre aquele velho patriotismo norte-americano, sobre como os "bons homens brancos" lutaram bravamente pela liberdade dos negros. É também, um antigo desejo de Steven Spielberg em levar para as telas a vida de Abraham Lincoln. Ok, ele conseguiu, mas sua obra provavelmente será logo esquecida assim que a cerimônia do Oscar acabar, não há nada neste longa que permaneça na memória, um grande momento ou uma grande cena, ele simplesmente acontece, sem o envolvimento do público. A verdade é que faltou Spielberg neste filme, os seus velhos exageros parecem fazer falta aqui, é tudo tão calmo e sem sal, sequências que poderiam ser marcantes são amenizadas. Uma produção caprichada de um filme sem personalidade, sem emoção. 

NOTA: 6,5




quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Crítica: Amor (Amour, 2012)

O austríaco Michael Haneke é um dos diretores mais consagrados do cinema atual. Realizou obras como "Violência Gratuita" (1997) e "A Professora de Piano" (2001), no entanto somente teve seu trabalho reconhecido em 2005 quando venceu a Palma de Ouro de direção no Festival de Cannes com o filme "Caché". Ainda no Festival, venceu na categoria Melhor Filme em 2009 por "A Fita Branca". Haneke retornou ano passado com sua mais recente obra, "Amor", vencendo como Filme e Diretor em Cannes. Ou seja, um diretor que já levou importantes prêmios por sua prestigiada filmografia e "Amor" não veio para provar mais nada, apenas confirmar o talento deste grande diretor. No entanto, a frieza com que trata suas tramas, sua marca registrada, acaba que afastando uma parcela de seu público. No fim, trata-se de filme forte, mas sem sentimentos.

por Fernando Labanca

Georges e Anne são um casal de idosos que vivem num espaçoso apartamento e apesar de tanto tempo juntos, ainda são apaixonados. Eis que após uma complicada cirurgia, Anne fica com seu lado esquerdo paralisado, é obrigada a andar de cadeira de rodas e aos poucos seu corpo vai se degenerando, é então que surge o momento em que ambos precisam realizar a maior prova de amor de todas, superando seus limites, enfrentando as dificuldades e encarando o triste fim da vida. 


"Amor" tem como seu grande mérito o realismo com que trata sua história, chega a ser chocante a maneira como as cenas são mostradas, mesmo que momentos rotineiros. Vemos a todo o tempo Georges cuidando de Anne, que vai ficando cada vez pior. É triste o que este casal precisa se submeter, uma parte da vida que infelizmente é real e muitas pessoas precisam enfrentar. É interessante como Haneke explora o amor, é um novo ponto de vista, no momento de maior desgraça é quando seus personagens precisam provar a importância de um para o outro, é belo e ao mesmo tempo cruel e trágico, vemos aquele final que o cinema nunca mostra, muito distante do "felizes para sempre", a vida como ela é. O filme acaba chocando justamente pelo tom realista que o diretor nos revela o cotidiano do casal, é muito honesto em cada atitude, em cada fala, é também impactante todo o gradual processo de Anne ao decorrer da trama, tudo isso funciona, claro, devido a excelente atuação dos dois protagonistas, Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva.

Em certo momento, uma pomba invade o apartamento dos dois, é quando Georges tenta forçá-la a sair pela janela. Já em seu final, mais uma vez, uma pomba invade, no entanto, sua atitude muda, ele a coloca no colo, como se a sufocasse. Pode não haver significado algum nestas sequências, mas vejo como uma transformação do personagem, se no início, ele concordava com os rumos de sua mulher, a deixando viver da maneira como devia, assim como a pomba que ele permite ser livre novamente. Em seu final, Georges tem outra reação, vemos então, o quanto ele foi obrigado a mudar como pessoa, ele decide alterar o rumo daquela pomba, já não mais aceitando sua liberdade, talvez, sendo mais realista e menos frágil com a situação do animal, e não mais passional. Ainda em outro momento, Georges pergunta a Anne qual era sua imagem, e então ela responde: "Você é um monstro, às vezes". Conhecemos ao decorrer da trama, a complexidade deste personagem, onde quando se depara ao seu limite não vê outra saída a não ser liberar este monstro, suas atitudes surpreendem e em nenhum momento o roteiro o julga, jamais poderemos dizer o quão certo ou errado ele estava, apenas aceitamos, por mais difícil que seja.

No entanto, apesar das grandes ideias, a impressão que tive é que Haneke fez questão de não editar seu filme. Tudo ocorre de forma lenta, muitas vezes, cansativa, cenas longas como o almoço do casal, onde o diretor fez questão de mostrar todas as colheradas ou como a cena que citei, onde Georges tenta pegar a pomba, ele consegue depois de diversas, diversas e diversas tentativas e o diretor nos obriga a ver todas elas. Ainda temos que enfrentar longos segundos contemplando a paisagem de um quadro, totalmente desnecessário. Outro ponto que me incomodou foi o eterno looping de acontecimentos, o filme acaba que se resumindo em Georges cuidando de Anne, e ao longo do filme é apenas isso o que vemos. Ainda são inseridos alguns personagens para quebrar a mesmice, como a filha do casal interpretada por Isabelle Huppert, mas nada alteram. O grande problema de "Amor", porém, é acontecer apenas na tela, em nenhum momento Haneke convida seu público, apesar de se tratar de uma trama forte e de grande impacto, a frieza com que guiou as cenas faz destes acontecimentos algo vazio, sem sentimento, não causa empatia em seus personagens, nem mesmo nos momentos mais trágicos.

O filme se salva pela grande atuação dos protagonistas. Jean-Louis Trintignant, que não atuava há nove anos, retorna numa grande interpretação, trás muita verdade para Georges, seus diálogos e seus olhares, é tudo muito incrível. Emmanuelle Riva que está concorrendo ao Oscar por sua atuação, é muito merecedora do prêmio, o que ela realiza em cena é simplesmente impressionante, todas as mudanças de sua personagem, a atriz compreende e nos revela com grande sensibilidade e muita honestidade. Um filme acima da média, que apesar de ter um roteiro arrastado, cansativo por vezes, é muito realista e por isso pode chocar, surpreender até, com seu grandioso final. Sei  que a frieza é uma característica de Michael Haneke e faz parte da proposta do filme, mas assim como os outros trabalhos que vi do diretor, tive a mesma sensação de vazio, por mais impactante que seja suas tramas, parece haver pouco sentimento, por fim, acabei não me emocionando como acreditei que iria, é um bom filme, mas nada que seja memorável.
  
NOTA: 7



quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Crítica: O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012)

Todo ano, Hollywood parece selecionar um filme, aparentemente independente e de preferência uma comédia dramática, o coloca nas mais importantes premiações o transformando em "cult". O selecionado deste ano é o novo projeto do diretor David O.Russell, "O Lado Bom da Vida". Com elenco afiado e uma história cativante, o filme pode não ser tão incrível quanto querem que ele seja, logo que é um dos indicados ao Oscar de Melhor Filme, no entanto, não deixa de ser uma obra interessante e porque não, uma obra adorável.

por Fernando Labanca

Após ver sua mulher o traindo dentro de sua própria casa, Pat (Bradley Cooper) surta e vai parar numa clínica para tratar seus sérios problemas emocionais. Ao sair do local, tudo indicava que sua vida voltaria ao normal, assim como a paz em sua família, o que não acontece. Ainda atordoado pelos acontecimentos, acredita que pode se reconciliar com sua esposa, tendo atitudes estranhas como procurar seu vídeo de casamento em plena madrugada ou tentar compreender os livros que ela, professora de literatura, ensinava para seus alunos. Dentro de sua casa, porém, nada é tão normal assim, seu pai (Robert De Niro) é viciado em apostas e acredita que os jogos de futebol pode uní-los. Eis que, certa noite, um casal de amigos lhe apresenta Tiffany (Jennifer Lawrence), uma jovem viúva, ainda transtornada pela morte de seu marido e digamos, tão louca quanto ele. De certa forma, acabam se unindo devido seus problemas mentais e ele passa usá-la para reconquistar sua mulher, logo que por ordem judicial, não poderia se aproximar dela, nem mesmo lhe entregar uma tão sonhada carta, é então que entra Tiffany, que oferece ajuda. Em troca, Pat teria que aprender a dançar para juntos enfrentarem um concurso de dança. E sem que percebessem, esta louca e imprevisível relação dos dois acaba os salvando e os trazendo de volta para a vida real.


David O.Russell, que em 2010 lançou "O Vencedor", também indicado ao Oscar, mostrou sua grande habilidade como diretor e também sua habilidade em compreender as famílias excêntricas e da mesma forma que seu filme anterior, a família tem grande peso nas escolhas de seu protagonista, por mais bizarra que ela seja. David, também, não escrevia um roteiro desde seu filme de 2004, "Huckabees", no qual, alguns de seus personagens sentiam a ausência de algo em suas vidas, um certo vazio. Talvez essas habilidades que aprendeu ao longo de sua carreira, sua tentativa em compreender os seres humanos, o fez saber lidar com propriedade a velha história do "de perto, ninguém é normal". É tanta loucura que se vê em seu roteiro e todos aqueles excêntricos personagens que nunca sabemos se devemos ter pena ou nos divertir com suas jornadas. É interessante como os indivíduos nos são apresentados, sem julgamentos ou moralismos. Mais interessante ainda é quando ao conhecermos a família do tal louco da história, percebemos que são tão problemáticos quanto ele.

O casal de desajustados, que não se encaixam na sociedade e com seus sérios problemas emocionais. O cinema quase nunca viu um casal como este e por isso eles se tornam tão adoráveis, por mais loucos que sejam, Pat e Tiffany nos conquistam e torcemos por eles. O roteiro a todo instante alerta, um precisa do outro para viver. Chega a ser emocionante como eles acabam se salvando, como um acaba dependendo do outro para se fortalecer, renascer em meio aos seus problemas. Por este lado, o novo longa de O.Russell inova, simplesmente por ousar criar uma nova estrutura para um gênero tão desgastado, a comédia romântica. Não chega a ser um marco, muito menos tenta fugir dos clichês, mas encanta por seus protagonistas, seja pela maneira como se conhecem - ousaria dizer, foi um dos "primeiros encontros" mais geniais que já vi, onde a sinceridade e honestidade para com o outro assusta e diverte ao mesmo tempo -, seja também por toda a trajetória deles.

No entanto, "O Lado Bom da Vida" que de início parece algo inovador, vai logo mostrando que não foge das convenções do gênero. Seu final é bastante previsível e toda a história do concurso de dança está longe de ser tão original assim, apesar de ser agradável. A velha história de pai e filho que não se entendem, mãe que tenta ser o pilar de tudo, o ator negro e melhor amigo do protagonista que surge apenas para fazer piada Aliás, esta função ficou para o ator Chris Tucker, que é até engraçado, mas sua presença não faz o menor sentido, nunca. Robert De Niro está ótimo, mas confesso que me incomodou bastante todos os seus longos e chatos discursos sobre esporte, como se o público fosse obrigado a entender e a gostar de tudo aquilo. Tudo bem que o fato dele ser viciado em apostas tem lá seu sentido na trama, principalmente em seu final, mas irrita, ainda mais quando começa a ter muito destaque na história, por vezes tirando espaço do casal, que de longe é a coisa mais interessante no filme. E todas as cenas que acontecem na casa de Pat são de uma confusão extrema, chegando a ser difícil compreender o que está acontecendo. Pessoas gritando e andando a todo instante, um caos que nem sempre funciona.

Por mais que sua história seja cativante, a obra não deixa de ser um filme de atuações. Não é a toa que os quatro principais estão sendo indicados ao Oscar. Bradley Cooper, aquele que sempre víamos em comédias, finalmente prova que é capaz de ir além, convence no drama e compreende as inúmeras oscilações de seu difícil personagem. Robert De Niro que há muito tempo não aparecia tão bem em cena, surge incrivelmente bem. Já a australiana Jacki Weaver acaba não se destacando tanto. Sinceramente não consigo entender a badalação em cima da atriz, foi indicada ao Oscar há dois anos por "Reino Animal" e agora de novo. Ela é boa mas não é para tanto e aqui, infelizmente, ela só tem espaço para suas caras e bocas e sua indicação como Atriz Coadjuvante não faz sentido. Por fim, a belíssima Jennifer Lawrence, sem sombra de dúvida, uma das maiores revelações do cinema dos últimos anos. Os atores deste filme são bons, mas é ela quem definitivamente rouba a cena, faz de "O Lado Bom da Vida" muito melhor do que deveria ser. O filme se torna mais interessante quando ela entra em cena, fazendo de todas as outras em que ela não está presente menos empolgantes. Lawrence salva o filme e por ela já vale a pena ver. 

"O Lado Bom da Vida" é pouco para sua indicação ao Oscar de Melhor Filme e isso, infelizmente, pesou. Querendo ou não, este título acaba criando certa expectativa muito maior do que se não tivesse sido indicado. Poderia ter sido uma grande surpresa, poderia ter ganhado fama no boca-a-boca, mas não, a fama do Oscar o prejudicou. É, na verdade, uma grande produção disfarçada de filme independente. No entanto, entre tantos defeitos, que sempre faço questão de citar, o filme me agradou, aliás, é bem difícil não agradar. É feito para o público sair com um sorriso no rosto e consegue este feito com muito êxito, porém, diferente de tantas comédias românticas, este procura caminhos não tão fáceis para a resolução de seus conflitos. Seus personagens não são estereotipados, são reais, são honestos. Não há como não se encantar por Pat e Tiffany, que assim como seu final, no tão esperado concurso de dança, eles se provam imperfeitos, desajustados, mas que não desistem, que mesmo com seus problemas e dificuldades, sempre procuram ver o melhor de cada situação. Assim como tudo na vida, onde a dor é inevitável mas o sofrimento é sempre uma opção. Procuram enxergar aquele pequeno raio de esperança, pois apenas aqueles que lutam conseguem encontrar. Um filme sincero, divertido, inteligente, louco e caótico ao extremo (no bom sentido) e claro, muito emocionante. Para se ter na prateleira e ver outras vezes. Recomendo.

NOTA: 8

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Crítica: Django Livre (Django Unchained, 2012)

Já indicado ao Oscar 2013 de Melhor Filme, "Django Livre" marca o retorno de um dos diretores mais cultuados da atualidade, Quentin Tarantino. A cada cena, a cada diálogo, compreendemos o porquê dele ser visto como gênio, é a prova de que sua consagração não veio a toa. Poderia dizer que aqui ele realiza sua obra-prima, mas não farei, é como se diminuísse o valor de seus filmes anteriores, prefiro dizer que ele realiza mais um outro grande filme, tão bom quanto os outros, o que já é notável. Tarantino continua o mesmo, depois de tantos anos, ele ainda consegue construir obras magníficas, com muito estilo, sangue, humor e inteligência.

por Fernando Labanca

Dr. King Schultz (Christoph Waltz) é um caçador de recompensas, indo atrás dos criminosos mais perigosos dos Estados Unidos, porém para encontrar três irmãos assassinos ele precisa da ajuda de um escravo, um escravo bem específico, Django (Jamie Foxx), com "D" mudo, pois somente ele poderia reconhecer aqueles que o torturaram no passado. Prometendo-lhe a liberdade, os dois passam a trabalhar juntos quando Schultz reconhece o talento do ex-escravo em ser caçador, fazendo Django ser aquele odiado pelos negros, logo que era o único com roupa decente em cima de um cavalo e com uma arma nas mãos, capaz de se vingar de uma época que ele pretende não esquecer. E desta improvável união, ambos começam a fazer justiça e ganhar inúmeros inimigos, no entanto, Django ter algo a mais em mente, resgatar sua amada, Broonhilde (Kerry Washington) e para isso, ele e Dr.King mudam de identidade e vão parar em Mississipi, na mansão de Calvin Candy (Leonardo DiCaprio), um lugar onde escravos locais são treinados para lutar até morte e é lá onde está sua mulher e para tê-la de volta terão que manter a postura e conquistar este poderoso homem, o que eles não esperavam é que teriam que passar pela aprovação de outro ser, o fiel escravo de Calvin, Stephen (Samuel L.Jackson) que não confia em outro negro a não ser ele mesmo.


Confesso que antes de ver "Django Livre" o via como uma espécie de "Bastardos Inglórios" versão com escravos, talvez por ter Christoph Waltz no elenco e ter o mesmo clima de vingança e violência e o fato de eu simplesmente não ter gostado de "Bastardos" me fez ter um grande preconceito com este novo projeto de Tarantino, mesmo sendo fã admitido de "Kill Bill" e "Pulp Fiction". Acontece que queimei minha língua, já nas primeiras cenas deste novo filme, primeiro por Christoph Waltz, que me convenceu de imediato, não era mais o Coronel Hans Landa, e já provou ali, estava diante de algo totalmente novo. Definitivamente, superior ao seu longa anterior, com personagens mais convincentes, uma trama mais bem costurada e um roteiro muito mais dinâmico. E vemos mais uma vez, Tarantino se superando como roteirista e diretor, a verdade é uma só, estamos diante de mais um épico do diretor, mais um daqueles trabalhos que citaremos com um dos melhores que ele já realizou. É tudo muito incrível o que acontece ali na tela, o roteiro que já nos fisga na primeira cena e não nos deixa escapar até seu glorioso final. Sempre repleto de referências, desta vez, de western spaghetti se unindo a um tema bastante improvável, a escravidão no sul dos Estados Unidos na virada do século XVIII para o XIX. É até irônico do diretor se usar das referências de faroeste para retratar a história de dor e sofrimento da escravidão, sabendo que este tipo de "entretenimento" seria inaceitável para a época. São dois lados totalmente opostos onde Tarantino consegue domar com maestria. Sabe também dosar o drama daquela época e das pessoas envolvidas, sem claro, deixar seu humor de lado, que surge em momentos imprevisíveis, mas as piadas funcionam a todo tempo, e as encontramos em diálogos extremamente bem elaborados, rápidos e inteligentes, dignos de Tarantino.

O diretor sempre conseguiu, ao longo de sua carreira, reunir um elenco admirável e aqui não é diferente. Jamie Foxx, Christoph Waltz, Leonardo DiCaprio e Samuel L.Jackson dão simplesmente um show de interpretação, os quatro já merecem um Oscar, mesmo que somente os coadjuvantes Waltz e DiCaprio foram lembrados na premiação, e agora, depois de ter visto, aposto minhas fichas em Waltz. Jamie Foxx consegue no seu olhar e em suas expressões passar todo o ódio de seu personagem, parece haver toda uma trajetória de sofrimento e mesmo sem nunca sabermos o que ele passou, sabemos que ele tem motivos para se vingar, consegue ainda, passar um certo tom de inocência de Django, visto que ele nunca se comporta como deveria. Christoph Waltz, por sua vez, sabe o que faz em cena, sabe domar todo seus complicados e longos diálogos, trazendo verdade e uma divertida ironia a todos eles. Leonardo DiCaprio faz um vilão único, memorável, com trejeitos e ações imprevisíveis, e seu sarcasmo e carisma nos faz temer ainda mais suas atitudes. No entanto, quem mais me surpreendeu foi Samuel L.Jackson, que surge quase que irreconhecível, seja por seu andar lento, sua voz alterada, o ator se transforma completamente e o que parecia impossível depois de tantos anos de carreira, este é um de seus melhores momentos. Ainda vemos a bela Kerry Washington, que não desaponta, e participações como Jonah Hill, sempre ótimo e do veterano Franco Nero, conhecido no cinema por seus westerns spaghetti e também por já ter interpretado um Django em sua carreira, num filme italiano de 1966, personagem que inspirou Tarantino para este filme.

Mais do que um cinema de referências, Tarantino cria seu próprio estilo, sua própria maneira de contar uma história. Sabemos quando estamos diante de um filme dele, e apesar de seu maneirismo, não se limita como diretor, ainda é capaz de surpreender. "Django Livre" é uma obra fantástica, poderia escrever um único texto falando sobre os bons momentos do filme, porque há inúmeras sequências memoráveis, seja o primeiro encontro de Schultz com Django, seja a hilária armadilha dos mascarados ou a sangrenta batalha final, das cenas mais dramáticas e impactantes, do humor negro sarcástico, da bela construção de seus personagens, das cenas violentas e exageradas que não podem faltar quando se trata de Tarantino, da incrível fotografia, locações e figurinos, não deixando, é claro, de citar a maravilhosa e ousada trilha sonora. Enfim, é um conjunto de elementos que fazem de "Django Livre" um marco na carreira deste brilhante diretor. Esta é mais uma obra obrigatória de Quantin Tarantino, seja para quem admira seu modo único de fazer filme, seja para quem simplesmente procura uma obra de qualidade. Recomendo.

NOTA: 9,5




Outras notícias