quarta-feira, 4 de abril de 2018

Crítica: Com Amor, Simon

"Love, Simon" é teen, leve e despretensioso. No entanto, não deixa de ter um significado muito grande nos tempos de hoje. Seu recado é poderoso, importante e necessário. 

por Fernando Labanca

Chamar um filme de milagroso é muita coisa. Até exagero. "Com Amor, Simon", porém, merece esse elogio. Acima de qualquer coisa, estamos falando de uma obra que tem o poder de atingir muita gente. Ao narrar a jornada de um jovem que não tem a coragem de se assumir gay, o longa acaba falando com e por muitos adolescentes que enfrentam ou já enfrentaram este processo. Um processo de aceitação doloroso, difícil e que requer muita coragem. É bom quando uma sociedade evolui e filmes como este são possíveis. Quando um personagem representa, inspira e se torna referência para aqueles que temem agir igual. Simon, então, se torna a voz de quem quer dizer, mas falta a força. Simon é aquele bom amigo que diz: "vai dar tudo certo". Parece pouco, mas é tudo para quem até agora não tinha ouvido essas palavras do cinema. E precisava ouvir. Muita gente precisa ouvir. O que o roteiro diz aqui é grande e precisa ser dito em alto e bom som.


Baseado no livro "Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens" de Becky Albertalli, atravessamos essa jornada de descobertas ao lado de Simon (Nick Robinson). Vive com uma família adorável e tem, ao seu lado, os melhores amigos que alguém poderia ter. No entanto, ainda que tudo soe perfeito em sua vida, o fato de ser gay e não poder dizer o atormenta, o transforma nesta pessoa que caminha inquieto, sempre com um segredo. O problema maior começa quando este segredo é ameaçado e Simon, alvo de chantagens, se vê obrigado a ter atitudes estranhas, transformando a vida de seus próprios amigos para impedir que o que mais tema aconteça: que todos aqueles que ama tomem conhecimento daquilo que escondeu durante anos. 

Com uma vibe John Green otimista de se contar uma história, finalmente o cinema comercial encontrou um protagonista gay. É estranho pensar que uma obra como esta ainda não tenha sido lançada. Finalmente ele é o centro da história e fugindo de qualquer estereótipo, Simon é como qualquer um de nós e é importante que ele seja. Ele é um adolescente comum que frequenta o colégio, mas que por medo, não se sente livre para ser quem realmente é. O observamos e sentimos sua dor e sentimos o quão injusto isso é. O quão injusto é impedir que alguém como ele não receba a atenção e amor que merece. Torcer pelo personagem é torcer por nós mesmos. Torcer por tantos Simons e jovens calados que existem por aí.

Incomoda um pouco esta felicidade nada espontânea da obra, uma vida quase irreal, onde tudo dá certo. A vida de ninguém é assim. Mas ao seu final, pensei e refleti comigo mesmo. Talvez seja exatamente isso o que os adolescentes neste momento precisam, desta dose de esperança que o cinema pode oferecer. A trilha sonora pop - que é praticamente um CtrlC+CrtlV de "Cidades de Papel" - empolga. Os personagens são extremamente cativantes e tudo é colorido, atual e bem humorado. É um produto fácil de ver e de fácil digestão também. Pode soar uma narrativa inofensiva, no entanto, penso que isso seja fundamental. "Love, Simon" tem o poder de alcançar muita gente e este é seu maior propósito e é lindo justamente por isso. Porque é acessível e precisamos que ele seja acessível. Histórias LGBT geralmente são tristes demais, envolvem culpa e tragédia. Não, neste momento necessitamos deste otimismo. Precisamos de um filme que nos inspire e nos diga que no fim tudo se resolve. Estamos prontos para ver este final feliz e todos aqueles que se reclusam precisam saber que ele é possível também.

O elenco todo é ótimo e todos funcionam juntos. O roteiro acerta ao compor todos eles e como cada um acaba tendo uma função importante na história. Jennifer Garner e Josh Duhamel me pareceram a escolha perfeita para interpretem os pais de Simon. Eles trazem o humor e a sensibilidade necessária para uma das cenas cruciais da obra. Katherine Langford, revelação da série "13 Reasons Why", se destaca aqui, assim como o jovem Nick Robinson que vai bem como protagonista. Claro que nem tudo são flores, e o filme acaba perdendo tempo com personagens extremamente irritantes como Martin, interpretado por Logan Miller. Entendo a importância dele na trama, mas incomoda muito suas aparições, além de outros tantos alívios cômicos que se deletados teriam o mesmo efeito. 

Um dos melhores momentos da obra é quando, em uma espécie de sketch cômico, os amigos do protagonista se revelam heterossexuais para seus pais, que recebem a notícia surpresos. É neste sarcasmos que a obra traz uma de suas belas mensagens. A dor de Simon vem justamente neste fardo de ter que se assumir. Assumir é uma palavra forte que sempre esteve atrelada a culpa. Por que assumir aquilo que você sempre foi? Isso te exclui, te torna não digno do amor e aceitação que precisa. Torna aquilo que vem tão fácil para os outros, tão difícil e inacessível para você. Quem dera "Com amor, Simon" tivesse sido lançado no começo dos anos 2000. Quem dera toda essa informação tivesse nos inspirado e nos dado força a tantos anos atrás. Não nasce aqui uma obra-prima do cinema contemporâneo, mas nasce aqui um filme de extrema importância, porque ele conversa com aqueles que querem ouvir, porque ele é um sinal que evoluímos. É a referência que nos faltava. É a prova concreta de que todo mundo merece uma história de amor. Todo mundo mesmo. No mais, um feel good movie muito bem-vindo, delicado e que te levará facilmente às lágrimas. 

NOTA: 9



País de origem: EUA
Título original: Love, Simon
Ano: 2018
Duração: 109 minutos
Distribuidor: Fox Film do Brasil
Diretor: Greg Berlanti
Roteiro: Elizabeth Berger, Isaac Aptaker
Elenco: Nick Robinson, Katherine Langford, Alexandra Shipp, Logan Miller, Jennifer Garner, Josh Duhamel, Tony Hale






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