quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Crítica: As Aventuras de Brigsby Bear

A imaginação e tudo aquilo que nos difere. 

por Fernando Labanca

"Brigsby Bear" chegou este ano sem alarde algum. Quase ninguém descobriu, mas é daquelas obras que merecem ser achadas. Produzido pelo comediante Andy Samberg (da série Brooklyn Nine-Nine), que aqui faz uma ponta, o filme vem com uma trama um tanto quanto perturbadora e bizarra. Apesar de ser, inesperadamente, assustador, o longa encanta pela forma sensível com que desenvolve sua trama, encontrando humor quando não se espera, conseguindo ser doce quando poderia ser simplesmente trágico e melancólico. 

O filme já nos apresenta uma reviravolta em seus primeiros instantes, quando o protagonista descobre que sua vida inteira foi uma grande mentira. James (Kyle Mooney) é um homem excêntrico que passa suas horas trancado dentro de seu quarto, assistindo sua série de TV favorita, o Brigsby Bear. Além de colecionar itens e desenvolver longas teorias sobre a trama, aquele urso acaba por lhe ensinar todo seu caráter. Eis que tudo muda quando policiais invadem sua casa e James descobre que tinha sido vítima de um sequestro, onde estava sendo refém de dois estranhos que passou a vida toda acreditando serem seus pais. Do lado de fora, ele reencontra com seus pais biológicos e passa a descobrir o mundo que lhe foi escondido todos esses anos.


Em uma espécie de "O Quarto de Jack" versão light, acompanhamos nosso protagonista adentrando a realidade e se deixando absorver por todo o conhecimento que lhe é dado. O grande problema é que muitos anos se passaram e tudo o que James conhece sobre a vida é Brigsby Bear, que na verdade, nunca existiu e não passou de uma criação perturbadora de seu sequestrador. Sem conseguir se desvincular dessa fantasia, ele decide fazer um filme sobre este seu herói, encontrando um fim para a história que nunca teve. E dos encontros inesperados que acaba tendo "do lado de fora", acaba juntando um time de pessoas interessadas neste seu sonho repentino. É curioso como, no fim, cada indivíduo que cruza o caminho de James acaba por se afeiçoar ao bizarro universo em que vive. A realidade deixa de ser novidade quando conhecem a visão distorcida que ele tem do mundo e ao invés de apresentarem o que é o mundo, todos se unem para viver sua distorção. 

A grande beleza de "Brigsby Bear" e justamente esse efeito que o protagonista traz às vidas das pessoas. Sua inocência acaba por recuperar aquela criança escondida em cada um, aquela vontade de viver uma aventura, uma história de ficção. Aquela liberdade de poder encontrar na vida o parque de diversões que sumiu quando todos cresceram. James vem para dizer o quão triste é não viver os sonhos que eram tão importantes na infância. O roteiro consegue extrair esses sentimentos com muita delicadeza, sem nunca perder seu humor nonsense e sem nunca esconder o peso de sua trama. É um daqueles roteiros especiais que sabe dosar com cuidado suas tantas intenções, trilhando entre drama e comédia de forma sábia e inteligente. Apesar das sutilezas e de nunca se aprofundar por completo em cada situação, apressando muitas delas, inclusive, o filme nos inspira. 

Kyle Mooney encontra o tom certo para compor este interessante personagem. É engraçado, natural e consegue extrair piadas de situações completamente impróprias. Aliás, muitas vezes é difícil saber se devemos rir ou não, tamanha complexidade de sua trama. É pesado, denso e o filme nunca procura os caminhos fáceis simplesmente porque é uma "comédia". Felizmente, o roteiro usa o humor a seu favor e encanta, emociona e nos deixa apaixonados por este estranho mundo de James e seu herói vestido de urso. Esta sua empreitada no universo do cinema acaba, também, por entregar sequências milagrosas, com seus efeitos "toscos" que nos remetem a programas de TV antigos. Com ótimas referências, "Brigsby Bear" é uma pérola a ser achada. Fotografia, trilha sonora e todo seu design de produção nos levam para uma viagem bizarra e fascinante, digna de ser apreciada. É um brinde à nossa imaginação e como a vida ganha luz quando damos voz à ela.

NOTA: 8,5



País de origem: EUA
Título original: Brigsby Bear
Ano: 2017
Duração: 100 minutos
Distribuidor: -
Diretor: Dave McCary
Roteiro: Kevin Costello, Kyle Mooney
Elenco: Kyle Mooney, Greg Kinnear, Ryan Simpkins, Claire Danes, Mark Hamill, Matt Walsh, Michaela Watkins, Andy Samberg


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