Alegria e riso neste mundo sombrio
por Fernando Labanca

Temos aqui um profundo estudo de personagem. O roteiro nos permite mergulhar a fundo em sua psiquê. Neste sentido, é incrível toda sua evolução na tela, em como, no início, vamos ganhando pistas da mente doentia deste solitário homem, como ele age diante de tanta indiferença e descaso. Todd Phillips constrói quase que um terror psicológico aqui, um produto denso, imersivo e desconfortavelmente realista, violento. Acompanhamos a construção de Arthur Fleck (Joaquin Phoenix), sua busca por um espaço nesta sociedade que o rejeita e sua relação com as pessoas ao seu redor. É interessante analisar como cada um desses encontros revelam sobre sua personalidade mórbida, machucada. Chega a ser triste esta sua inocente crença de que veio para trazer alegria a um mundo tão sombrio e toda a humilhação que recebe em troca. Se no começo do filme, descobrimos que sua risada nada mais é que um ato involuntário, um efeito de seus transtornos, ao fim, vemos Coringa abraçando quem realmente é e o que se tornou diante de tanto caos. Seu riso, que antes era uma doença, vira provocação. Um ato assustador de quem renasceu e não tem mais nada a perder.
"Coringa" se torna obrigatório quando o que ele conta diz muito sobre nosso mundo. É brilhante em como eles usam da história da origem de um personagem fictício para denunciar nossa realidade. E se a obra alcança um nível alto de perturbação é porque assumimos nosso miserável reflexo ali. Acredito que a obra diga muito sobre individualismo, sobre essa indiferença para com o próximo e o quanto isso afeta as minorias. É quase como uma súplica por mais empatia, por olhar ao lado e perceber quem precisa de ajuda. Súplica por mais afeto. Por vezes até esquecemos que estamos falando das ruas podres de Gotham. Poderia ser qualquer cidade. Poderia ser a solidão e tristeza de qualquer outra pessoa. Arthur Fleck é invisível e sua luta é por reconhecimento, ser visto além de seus transtornos. Há quem diga que seja um produto irresponsável, que glorifica a violência. De fato, "Coringa" é filme extremamente violento - e confesso que me senti desconfortável vendo algumas cenas, que são explicitamente gráficas -, mas acredito que seus atos sejam conscientes e sua mensagem foi dada. De forma agressiva e impactante sim, mas ao menos será ouvida e é importante que seja.

NOTA: 9,5
País de origem: EUA
Título original: Joker
Título original: Joker
Ano: 2019
Duração: 122 minutos
Distribuidor: Warner Bros.
Diretor: Todd Phillips
Roteiro: Todd Phillips, Scott SilverDiretor: Todd Phillips
Elenco: Joaquin Phoenix, Robert De Niro, Frances Conroy, Zazie Beetz
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