quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Crítica: Midsommar - O Mal Não Espera a Noite

Que comecem as festividades.

por Fernando Labanca

É necessário estar preparado para o que "Midsommar" tem a oferecer. Não é de fácil digestão e compreendimento. O diretor Ari Aster, revelado ano passado com "Hereditário", retorna em mais um terror perturbador, continuando a entregar um cinema primoroso e provando ser um dos nomes mais relevantes dentro do gênero. Não há ninguém fazendo o que ele faz, da forma corajosa como ele faz. Temos aqui uma experiência incomum, intensa, no entanto, na necessidade de entregar algo a altura de seu trabalho anterior, o cineasta acaba por realizar, também, uma obra pretensiosa, tentando a todo custo, causar os mesmos efeitos e sucesso que teve previamente. É um produto que tenta abraçar muita coisa ao mesmo tempo e nem tudo o que abraça, infelizmente, é bem desenvolvido.

Existe, aliás, uma atmosfera que muito se assemelha com a de "Hereditário". O terror se encontra no trauma de seus personagens, no rancor, na mágoa e jamais necessita de sustos para nos manter aterrorizados. O pavor está presenta até no silêncio, na calmaria. Ari Aster parece construir, através de imagens poderosas, a encenação perfeita de um pesadelo. De um sonho cruel que queremos acordar e esquecer mas não conseguimos. É claustrofóbico mesmo quando tudo acontece ao ar livre e diante da claridade do sol. Assim como em seu trabalho anterior, sua protagonista enfrenta uma perda lastimável ao início da trama e durante todo o filme, acompanhamos esta sua jornada de renascimento, de encontrar uma força maior que lhe retire todo seu sofrimento, sua dor. "Midsommar" nos leva ao inferno em uma obra sensorial, perturbadora e completamente imersiva. É desconfortavelmente hipnotizante. O diretor não tem piedade, muito menos noção de quando parar. 


A protagonista da vez é Dani (Florence Pugh), que após vivenciar uma tragédia pessoal, decide viajar ao lado de seu namorado Christian (Jack Raynor) e seus amigos, mesmo contra a vontade de todos eles. O grupo vai até a Suécia para participar de um Festival de Verão, no entanto, ao chegarem lá, descobrem que estão se envolvendo uma perigosa seita com adoração pagã e rituais bizarros. Ao que tudo indica, é um caminho sem volta e logo o filme nos apresenta um universo completamente único, estranho e incômodo. É interessante como o roteiro mergulha nessas lendas e tradições, nos fazendo sentir como verdadeiros antropólogos tentando desvendar os mistérios que rondam aquele local e os tantos significados desta nova cultura. Inclusive, pouco é revelado até o final, o que não diminui seu impacto e só aumenta nossa curiosidade. Ficamos investigando cada passo, cada movimento, intrigados pelo o que poderia representar tudo aquilo. De fato, parece ter ocorrido um grande estudo por trás de sua realização e neste sentido, é lindo toda sua produção. Dos figurinos à sua arquitetura. Tudo parece indicar algo, mesmo que não seja claro à primeira visita. A trilha sonora pesada também nos ajuda a adentrar a tudo o que nos apresenta, ainda que manipuladora, engrandece seus eventos. 

"Midsommar" nunca segue por um caminho fácil, bem pelo contrário. Ari Aster nega a obviedade e constrói um filme diferente de tudo o que já vimos antes. Porém ele peca quando parece ter mais interesse no folclore que desenvolveu e esquece de seus personagens, que tinham tanto a dizer. É incômodo como todos perdem a força ao decorrer do filme, não ganham o tratamento que mereciam e alguns, até, são facilmente descartados até o fim. Seu roteiro é inconsistente e diminui a força de seus poderosos argumentos para desvendar uma seita que, ao final, alcança pouquíssimas conclusões. Acaba girando em torno dos mesmos questionamentos e não sai muito do lugar, não se aprofunda. Soa perdido, sem muito propósito, onde em alguns instantes, o texto parece não saber o que fazer com os indivíduos ali em cena e decide brincar aleatoriamente até descobrir onde eles conseguem ir. É cansativo e pouco revelador, principalmente por ser excessivamente longo e repetitivo. Por outro lado, é bem interessante todo o plot do casal, em como Christian lida com o trauma dela e em como Dani passa a questionar esse amor que ela tanto suplica, mas que nunca é possível ver nas ações daquele que sempre está a seu lado, mas nunca como um suporte, como família. 

Estamos diante de um cinema raro. Pretensioso sim, mas de extrema qualidade. "Midsommar" atrai pela bizarrice, pelo desconforto, pela beleza do incomum. O terror tem se tornado um dos gêneros mais interessantes do cinema atual e Ari Aster tem grande culpa nisso. Vale, ainda, destacar como a comédia é trabalhada aqui, muito bem inserida nos diálogos, tornando seu produto um pouco mais digestivo. Por outro lado, essa comicidade pode deixar o público confuso entre não saber se ri ou se sente repulsa. Termino falando sobre um dos maiores acertos da obra: Florence Pugh e todo seu potencial como atriz. Ela agarra este desafio com força e entrega uma performance monstruosa, potente e digna de prêmios. Apesar dos deslizes do roteiro, vale uma ida ao cinema. Um filme impactante, visceral, que choca pela violência gráfica e psicológica. Começaram as festividades e o inferno está decorado com flores. 

NOTA: 7,5



País de origem: EUA
Ano: 2019
Título Original: Midsommar
Duração: 147 minutos
Distribuidor: Paris Filmes
Diretor: Ari Aster
Roteiro: Ari Aster
Elenco: Florence Pugh, Jack Reynor, Will Poulter, William Jackson Harper



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