segunda-feira, 28 de maio de 2012

Crítica: Toda Forma de Amor (Beginners, 2010)

Vencedor do Oscar e Globo de Ouro 2012 na categoria Melhor Ator Coadjuvante para o veterano Christopher Plummer, "Toda Forma de Amor" é um delicado e sensível filme que narra de forma bastante complexa a inusitada relação de pai e filho e como eles são iniciantes diante de algumas situações da vida. Dirigido pelo artista gráfico Mike Millis, mais conhecido por fazer documentários e curta-metragens, o longa ainda conta com atuações de Ewan McGregor e da belíssima atriz francesa Mélanie Laurent.

por Fernando Labanca

Conhecemos a mente de Oliver (McGregor), e através de uma narração em off, toda a complexidade de seu mundo. No passado, seu pai Hal (Plummer) se assume gay aos setenta e cinco anos de idade, assim que sua esposa falece, depois de anos de casados. Passa a namorar um homem mais novo e se entrega com grande intensidade a este relacionamento. Não muito tempo depois, revela para o filho que tem uma doença terminal. Após a morte de Hal, Oliver, ainda apegado as lembranças do pai, conhece uma jovem atriz, Anna (Laurent), e tenta aos poucos se aproxima dela mesmo não tendo noção de como é amar alguém, pois durante anos se fechou em sua vida e não soube como aproveitá-la e assim, suas recordações, desde pequeno, assistindo de perto o fracassado relacionamento de seus pais até os últimos momentos de Hal, passam a moldá-lo como ser humano, justificando seus medos ao mesmo tempo que o encorajam para viver algo de verdade. 


Lançado diretamente nas locadoras aqui no Brasil, "Toda Forma de Amor" tem muitos elementos que justificam a escolha da distribuidora em não arriscá-lo no cinema, pois é uma obra não muito convencional, pode não agradar o grande público. Entretanto, é nítido a qualidade do filme. Não possui um roteiro linear e apesar desta técnica estar se tornando clichê, aqui ela é bem aproveitada e eleva o nível, feita de forma não confusa, cria um sensível quebra-cabeça onde aos poucos vamos conhecendo a mente do protagonista Oliver e como suas lembranças revelam os porquês de suas atitudes, o medo que ele tem em se envolver com alguém, o fato de ser cético em relação ao amor e como ele tem o dom em afastar aquelas pessoas que ama. É ainda belo o envolvimento que este tem com o pai e como a forma como Hal encarava a vida, doente, mas sem deixar de acreditar, velho, mas sem deixar de se jogar ao amor, sem temer se assumir homossexual, sem temer ser julgado, passa a modificar o modo como Oliver enfrenta a sua. E entre flashbacks, o roteiro também assinado por Millis se mostra consistente, conseguindo construir uma trama sem muitas surpresas, mas repleta de bons momentos. Em um filme que mostra como os seres humanos se sentem iniciantes quando enfim conhecem o amor e como este puro sentimento acaba salvando a vida das personagens.

É bastante nítido também a forte influência do clássico francês "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain", desde a forma como é narrado, mostrando de forma divertida e encantadora o modo como a vida era em cada ano citado por Oliver, revelando de forma nada sutil as características de cada época e cada personagem, onde a narração parece convidar o público a entender aquele mundo. Além dos belos momentos silenciosos onde a trilha sonora parece fazer seu papel, revelando sentimentos e claro, fazendo das cenas ainda mais interessantes, isso porque a trilha sonora minimalista lembra e muito aquela criada por Yann Tiersen em 2002, porém dessa vez foi composta pelo trio Roger Neill, David Palmer e Brian Reitzell e realizam um belo trabalho, sendo este aspecto um dos pontos mais positivos do filme. 

"The Begginers" se torna ainda mais interessante por seu poderoso elenco. Ewan McGregor é um figura que chama a atenção, sua voz conduz com delicadeza toda a trama e seu olhar tão profundo comove sem grandes esforços, tem uma performance notável. A bela Mélanie Laurent não é tão cativante assim, mesmo sendo linda e possuindo um adorável sorriso, por vezes parece fria demais e não é a primeira vez que sinto isso da atriz, ainda assim, parece se encaixar bem em sua personagem e funciona muito bem ao lado de McGregor. E claro, o coadjuvante de ouro, Christopher Plummer, que no auge de sua carreira se joga num personagem difícil e nada menos que merecido seu reconhecimento, é lindo o que o ator realiza aqui, memorável. 

No entanto, "Toda Forma de Amor", apesar dos inúmeros pontos positivos não chega a empolgar. A idéia é boa mas parece insuficiente para preencher os poucos minutos de duração que possui. Há cenas longas, que tem lá seus significados, mas nada que prenda muita a atenção. Além do estranho relacionamento entre Oliver e Anna, por vezes confuso, dificultando a compreensão de determinados conflitos, devido também a ausência de diálogos. E outro ponto que me desagradou um pouco foi o fato de Oliver passar a pixar as ruas, como forma do roteiro dizer que ele finalmente está vivendo sua vida, livre de julgamentos, sem temer consequências, mas acredito que existem maneiras mais interessantes e mais maduras de querer aproveitar a juventude, e nestas cenas ainda temos que acompanhar os patéticos novos amigos de Oliver que de tão bizarros aparentam ter cinco anos de idade. Em suma, não deixa de ser uma obra de qualidade, que consegue comover e encantar pela forma como a trama é guiada, que nos faz afeiçoar pelas personagens bastante humanas, além do fato do diretor ter construído algumas cenas que de tão belas fazem o filme valer a pena, um delírio para os olhos e ouvidos, devido às atuações competentes e diálogos de um roteiro bem escrito e uma trilha sonora muito bem composta e inserida. Recomendo.

NOTA: 7,5




Crítica: O Preço do Amanhã (In Time, 2011)

Andrew Niccol não é um nome muito forte em Hollywood, apesar disso, é um roteirista que já realizou trabalhos notáveis no cinema como "O Show de Truman" (1998) e "O Terminal" (2004). Como diretor trouxe para as telas filmes como "Simone" (2002) e "O Senhor das Armas" (2005). Em 2011, ele retornou como roteirista, produtor e diretor de "O Preço do Amanhã", já criando uma certa expectativa, pois seu nome é sinônimo de originalidade. Pois bem, a verdade é que sua originalidade retorna mais uma vez e o que vemos nesta ficção científica é uma obra inteligente, com sacadas que beiram a genialidade e que não se trata de um remake e nem uma adaptação de algum livro. Estamos numa época em que filmes como este parecem impossíveis de serem criados. Uma raridade.

por Fernando Labanca

Somos apresentados a este mundo futurístico. Onde cientistas descobriram uma forma de destruir o gene do envelhecimento. Todos os seres humanos vivem até os vinte e cinco anos, a partir deste momento, um relógio é ativado no corpo de cada um, é então que as pessoas precisam correr atrás de tempo. O tempo se tornou a nova moeda. O trabalho é pago com tempo, as compras são pagas com tempo. Existem os bancos que o armazenam para futuros empréstimos. Porém, acabou se criando uma intensa desigualdade social, onde os pobres não conseguiam tempo suficiente e os ricos esbanjavam e assim poderiam viver mais.

É neste cenário que Will Salas (Justin Timberlake) acaba perdendo sua mãe (Olivia Wilde), vitima desta desigualdade, que morreu por falta de tempo. Até que ele salva a vida de um milionário (Matt Bomer), que havia armazenado um século e antes deste homem se suicidar, por não mais aguentar viver, entrega todo seu tempo a Will. Com todas essas horas em suas mãos, ele passa a ir atrás de justiça, recuperar o tempo que os pobres jamais poderiam conquistar, porém quando ele percebe que está sendo perseguido pelos Guardiões do Tempo, acusado de matar o tal milionário, ele sequestra a filha de um poderoso magnata, Sylvia (Amanda Seyfried), como forma de se manter vivo. E ela, decidida a viver uma grande aventura, longe das regras da classe alta, passa a auxiliar Will em sua luta pela justiça, enquanto ambos vivem cada dia como se fosse o último, literalmente.


 
"Viva cada dia como se fosse o último". O cinema já nos mostrou este clichê clássico diversas vezes, mas a verdade é que ele nunca fez tanto sentido como neste filme. A intenção da obra é levar esta ideia para as telas de forma literal, onde o ser humano precisa conquistar o tempo a cada dia, caso contrário, ele morre. E assim, o roteiro inteligente de Niccol consegue explorar esta premissa muito bem, principalmente nos primeiros minutos de filme, onde este "novo universo" nos é apresentado. O longa ganha força justamente nesses momentos em que nos introduz a este mundo, nos revela uma nova cultura, uma nova forma de vida e é tudo muito original, muito bem pensado. Entretanto, perde sua força exatamente quando este mundo deixa de ser novidade a nossos olhos, pois é quando o filme sem mais espaço para expor sua criatividade, se revela um filme comum de ação, com vilões e mocinhos e perseguições que parecem não ter fim. A impressão que tive é que eles criaram uma situação incrível, extremamente bem elaborada para usar como cenário de um filme de perseguição sem grandes novidades, é como se o filme merecesse mais, tudo o que ocorre parece pequeno pela ótima premissa que eles desenvolveram no início

"In Time" conta com um elenco não tão poderoso. Justin Timberlake convence em seu papel, mas não surpreende, faz o que já se espera dele. Já Amanda Seyfried parece menor, em comparação com o que a atriz já realizou no cinema, sua performance deixa a desejar, num papel onde sua beleza é a única coisa que parece importar. No restante, nenhum grande destaque, Cillian Murphy fazendo mais uma vez um vilão, a bela Olivia Wilde, que confesso, realizou uma das mais incríveis cenas do filme, quando ela corre aos braços de seu filho, enfim, uma sequência um tanto quanto memorável. Ainda vemos alguns atores conhecidos do público por suas aparições em seriados, como Matt Bomer de "White Collar", Johnny Gallecki, o Leonard de "The Big Bang Theory" e Vincent Kartheiser da série "Mad Men". Enfim, coadjuvantes de luxo que surgem e logo desaparecem e ninguém além de Timberlake tem muito espaço para fazer algo de destaque.

Uma idéia incrível desperdiçada em um mero filme de ação. Sim, ainda temos a boa direção de Andrew Niccol, as sequências ainda são boas e a ação funciona grande parte da obra, boas perseguições que prendem a atenção, auxiliada pela ótima fotografia e com a construção de um cenário bem interessante, ilustrando muito bem este universo apresentado, desde a arquitetura dos prédios ao novo design dos automóveis, além do belíssimo figurino realizado pela vencedora do Oscar, Colleen Atwood (Alice no País das Maravilhas). Entretanto, não deixa de ser só mais um filme de ação, onde a grande idéia lançada no início se perde em função de uma obra para a grande massa, com conflitos fáceis, perseguições vazias, correria, onde no final já nem mais nos lembramos o porquê dos protagonistas estarem fugindo, tudo o que Hollywood gosta de vender. No entanto, eu ainda o recomendo,  por mais que possua seus defeitos, não deixa de ser original, com direito a boas sacadas, e discussões válidas sobre desigualdade social e reflexões sobre a estranha obsessão de algunas pela vida eterna e o que ser humano é capaz de fazer por ela, e no meio de tantos filmes do gênero, esse acaba se destacando por suas grandes idéias. 

NOTA: 7


segunda-feira, 7 de maio de 2012

Crítica: Os Vingadores (The Avengers, 2012)

Avante, Vingadores!

por Fernando Labanca

Um dos filmes mais aguardados do ano, não só pelos nerds aficionados pelas HQ's, mas pelo público geral que desde a estréia de "Homem de Ferro 2" em 2010 está a espera do tão comentado "Os Vingadores". Filme que reúne alguns dos heróis mais conhecidos, como Homem de Ferro, Thor, Capitão América e Hulk, onde cada um teve seu filme solo dando pistas sobre esta obra, que já é aclamada, não só pelo público, mas pela crítica. É baseado nas HQ's da Marvel, criação de Stan Lee, Jack Kirby e Dick Ayers, nasceu na década de 60, como uma resposta do estúdio para a Liga da Justiça, da DC Comics. 

Com a direção de Joss Whedon, já conhecido pelo mundo nerd, por ter escrito para a série "Buffy- A Caça Vampiros" na década de 90, além de seus roteiros para filmes como "Toy Story" e "Alien: A Ressurreição" e que só teve a oportunidade de seguir na direção em 2005, com o filme "Serenity", lançado diretamente nas locadoras, aqui no Brasil. Portanto, é um cara entendido do assunto, e além de dirigir, escreveu o roteiro ao lado dos próprios criadores da HQ!

Vemos na tela, o encontro desses heróis. São chamados pela SHIELDS, a pedido de Nick Fury (Samuel L.Jackson), que tem como missão reunir esses homens poderosos para salvar a Terra, pois ela está ameaçada com a chegada de Loki (Tom Hiddleston) que tem nas mãos o Tesseract, uma fonte de energia com potencial desconhecido e deseja dominar o mundo. Viúva Negra (Scarlett Johansson), Capitão América (Chris Evans) e Tony Stark (Robert Downey Jr.) são convocados para a missão, porém eles contam com um grande reforço, Bruce (Mark Ruffalo), o Hulk. Mas os problemas familiares continuam quando Thor (Chris Hemsworth) retorna de seu mundo para impedir que seu irmão, Loki continua com seu plano.



A grande sacada de "Os Vingadores" foi ter reunido esses heróis em um só filme. Parecia até algo impossível de se fazer. Mas conseguiram. É um prato cheio para os nerds e para o público que esperava ansiosamente este momento nada menos que épico. E temos o prazer de ver cada herói em cena, pois cada um tem seu espaço dentro da história, alguns são melhores desenvolvidos que outros. Mas no fim das contas, o que acaba valendo a pena mesmo é ver as cenas de ação e aventura, comandadas com capricho por Joss Whedon, como as cenas finais que são de tirar o fôlego, é um deleite vê-los juntos, lutando como uma equipe. Ou até mesmo as pequenas batalhas que acontecem entre eles mesmos, como a interessante sequência da luta entre Thor, Capitão América e Homem de Ferro. Até mesmo Hulk, que teve momentos ruins no cinema, surge melhorado, em boas cenas de ação. O que dizer então de Viúva Negra e sua agilidade em acabar com o inimigo? Os efeitos especiais são de cair o queixo. É tudo muito bem feito e muito bem encaixado nas cenas, acredito que o diretor soube fazer bom proveito da tecnologia e construiu sequências agradáveis aos olhos. Auxiliado ainda pela trilha sonora, nada memorável, mas que faz bem seu papel, composta por Alan Silvestri.

O problema é que a história é simples. Eu diria, simples até demais. Acredito que eles criaram uma propaganda enorme em cima do filme, era de se esperar algo a altura dessa propaganda e infelizmente não aconteceu. Tudo é muito simples. O vilão que quer dominar o mundo e os heróis que surgem para salvar a Terra e blá bla blá. Acho que já vi isso em muitos filmes e eles nem se preocuparam em criar algo novo ou pelo menos repetir os clichês numa história melhor contada. Até as duas horas de filme nada realmente acontece. Colocam os heróis em cena, fazendo piadas, algumas funcionam, outras não, mas enfim, estão lá a todo tempo, eles discutem como crianças e depois partem para a briga e o filme fica assim até que eles resolver agir na cena que é a final, ótima por sinal, mas numa batalha que não sai de uma avenida. Tudo muito pequeno para um filme de super-herói. Para piorar as personagens são meros fantoches para as batalhas, surgem como personagens desinteressantes, como se o roteirista tivesse pensado "bem, já que todos eles tiveram um filme solo, porque perder tempo criando mais uma história para cada um deles, vamos colocar eles em brigas e o público vai gostar". Pois bem, o público gostou. Mas não acho que só porque é um filme de herói eu não possa esperar uma história interessante e isso não acontece. Os personagens não possuem nada, estão ali para lutar, apenas. Filmes como todos de "X-Men" e "Watchmen" souberam dar espaço para inúmeros heróis e ainda conseguir escrever uma história digna para cada um deles. E é válido citar a belíssima adaptação de Christopher Nolan para Batman, que é um blockbuster, mas que faz o público pensar.

Ainda na história há várias falhas imperdoáveis e um tanto quanto bizarras. Hulk é de fato, um dos personagens mais interessantes desse filme, isso porque é interpretado por Mark Ruffalo, só por isso. Mas o personagem tem suas falhas. Em uma cena ele não consegue controlar o Hulk, sai quebrando tudo e tenta até mesmo matar uma aliada, na outra cena, ele revela seu grande segredo, ele consegue controlar o monstro que há nele, incrível, não? E o poder patético de Loki em controlar as pessoas, deixando elas a seu favor, mas que são libertas dessa "maldição" com um golpe na cabeça e do nada mudam de lado, como aconteceu com o Gavião Arqueiro (Jeremy Renner). Loki, por sua vez, perde a força que teve no filme "Thor", se torna um vilão vazio, e graças ao roteiro participa de cenas lamentáveis como quando ele faz as pessoas se ajoelharem para ele. O Homem de Ferro tem toda a atenção voltada para ele, isso porque ele é Robert Downey Jr, pois o personagem não faz nada o filme inteiro, está em cena para mostrar seu humor sarcástico. Por falar nisso, há um humor exagerado no longa, o fazendo perder ainda mais sua credibilidade, piadas atrás de piadas e nenhuma situação é levada realmente a sério. Uma pena. Por outro lado, algumas funcionam perfeitamente e caem bem a determinadas cenas.

Quanto as atuações, piloto automático total. Robert Downey Jr interpreta Robert Downey Jr. Chris Evans até se esforça, mas infelizmente seu personagem tem pouco espaço. Chris Hemsworth só aparece lutando e gritando com alguém, fraco e seu Thor parece inútil no meio dos heróis. Scarlett Johansson está linda como sempre, seduz mesmo quando não tem a intenção, mas não se esforça, mas está bonita e é o que parece importar para compor Viúva Negra. Os destaques acabam ficando para Mark Ruffalo, não só por ser o melhor dentre todos os atores, mas por ter conseguido inovar na composição de seu personagem, não repetindo o que outros atores já fizeram. Além dele, Tom Hiddleston se esforça como o vilão Loki e convence. No elenco ainda nomes como Samuel L.Jackson, Jeremy Renner e Stellan Skarsgaard, tirando o último, todos no automático também. Temos ainda Clark Gregg, como o agente Phill, bem em seu papel, representando os fãs dentro do filme. E para minha surpresa um rosto conhecido dentre os nerds que surge sem grande importância na trama, mas é muito bom vê-la em cena, Cobie Smulders, a Robin do seriado "How I Met Your Mother", como a agente Maria Hill.

"Os Vingadores" não vai muito além de um blockbuster com ótimos efeitos visuais e sonoros. Sei que se trata de um produto de massa, mas mesmo assim, ainda procuro inteligência num filme e algo me faça pensar. Não acredito que só porque seja um blockbuster preciso desligar meu cerébro e aceitar tudo o que venha a minha frente. Sei também que faço parte de uma minoria, logo que muitos o estão aclamando e dizendo que este é "o melhor filme de herói de todos os tempos". Não acredito nisso, pelo contrário, para conquistar este termo, o filme precisa no mínimo conseguir contar uma história decente e este esteve bem longe disso. Em suma, uma obra que diverte e que vale a pena levar os amigos para o cinema num final de semana, pois dentro de sua proposta até que funciona, consegue entreter, mas não vai além disso, não vai além do que se espera dele. Entretenimento puro, que não exige reciocínio, muito barulho e quase nada de conteúdo!

NOTA: 6,5 


[Crítica: Homem de Ferro2]
[Crítica: Thor]
[Crítica: Capitão América]


sexta-feira, 4 de maio de 2012

Crítica: American Pie: O Reencontro (American Pie Reunion, 2012)

Poucos filmes merecem o termo "marcou uma geração". Este feito, "American Pie", famoso por seu besteirol americano, conseguiu. A obra que é um retrato irônico dos jovens da década de 90 prova em seu quarto filme oficial que o tempo não o fez parecer uma obra esquecível, muito pelo contrário. Parece que o tempo fez bem para Jim e seus companheiros. Hoje, vendo a quarta parte, o longa carrega em si um delicioso clima nostálgico e é engraçado como, devido ao esperto e bem elaborado roteiro, "O Reencontro" se mostra não só o capítulo mais maduro de todos os filmes, mas é aquele que parece fazer mais sentido, mesmo retratando uma vida passada. Uma sequência de qualidade que homenageia toda uma geração, que faz o que seria impossível: prova ser o besteirol mais importante dos últimos anos.

por Fernando Labanca

Treze anos após o término do colégio, a classe de 99 se reúne para celebrar aquele tempo passado e se reencontrar com os velhos amigos. Jim (Jason Biggs), casado com Michelle (Alysson Hanigan) e agora com um pequeno filho retornam para o final de semana épico, fazendo a velha equipe se unir novamente. Kevin (Thomas Ian Nicholas) que também está casado, Oz (Chris Klein) que se tornou um famoso âncora de programa esportivo, além de ter participado do "Dancing With Stars" e Finch (Eddie Kaye Thomas) que passou anos se aventurando pelo mundo. Decididos a não chamarem Stiffler (Seann William Scott), o plano logo de início dá errado quando o destino os coloca juntos outra vez. Com a presença do amigo, eles acabam fazendo justamente o que não queriam, se meter em encrencas.

Entretanto, por de trás deste reencontro, cada um tenta conviver com seus próprios conflitos. Jim e Michelle que já não mantém uma relação sexual tão ativa quanto antes, Kevin que se depara com sentimentos antigos ao rever Vicky (Tara Reid), sua primeira grande paixão, assim como Oz que se reencontra com Heather (Mena Suvari). E Stifler que acaba aprendendo a mais dura das lições, os tempos do colégio passaram, ele já não é o maioral, as coisas mudaram, os anos dourados ficaram, infelizmente, para trás. E juntos percebem que a vida os guiou para rumos bem diferentes do que haviam planejado no passado. 


No cinema existem sequências e sequências. Existem aquelas que são feitas por dinheiro e existem aquelas que possuem um intuito, um propósito. "American Pie: O Reencontro", sem sombra de dúvida, sem encaixa no segundo grupo. Como disse anteriormente, os anos fizeram bem para a série de filmes, é interessante ver como o longa faz sentido nos dias de hoje, o que nos leva a um ponto ainda mais interessante: American Pie de 1999 foi um filme vanguardista, que pensou além de seu tempo. Não estou dizendo que os adolescentes retratados no filme são perfeitamente baseados na realidade, pois não são, são uma versão bem distorcida e cômica, mas que dentro de sua proposta, sempre funcionou muito bem. Neste quarto filme, os roteiristas conseguiram fazer toda a saga fazer sentido, o que antes eram só jovens atrás de sexo, hoje é um filme de comédia inteligente, com conceito.

Quando digo vanguardista, me refiro principalmente a inserção de uma tecnologia que na época era rara, os vídeos no youtube, as redes sociais, a velocidade da informação. O roteiro brilhantemente, ainda aproveita e faz boas piadas sobre essa nova geração. O que há de diferente no mundo de hoje, como os telefones celulares que na época não eram tão comuns entre os jovens. E para isso, eles colocam a turma de Jim em oposição a essa nova geração, é então que a diferença fica bem clara e passamos a analisar o quanto as coisas mudaram. É hilário ver Stifler ter que apelar para a saga Crepúsculo para conseguir transar e o quanto seu tipo de humor não faz o menor sentido entre as pessoas desta época. O filme ainda é recheado de boas sacadas, piadas nada inocentes assim como a série se tornou popular, ainda apelando para cenas de nudez, quase todas desnecessárias, mas que fazem parte do pacote. E apesar de retratar os jovens da década de 90, os roteiristas elaboram um universo capaz de agradar os iniciantes em "American Pie", mas é claro, aqueles que acompanharam os episódios anteriores compreenderão muito mais as piadas e acharão muito mais graça na trama.

A intenção de "O Reencontro" é justamente nos trazer um clima nostálgico. Ver aqueles personagens na tela é nos lembrar de como o tempo passou e é quase inevitável não sentir um pontada no coração. A cada personagem antigo que surge é uma lembrança nova. O filme tem este sentimento causado no público como seu maior triunfo. E a trama é sobre essas pessoas que um dia foram adolescentes, mas que cresceram, tiveram que crescer, arranjar um emprego, amadurecer, cuidar de uma família, encarar as responsabilidades da vida adulta e perceber que não somos aquilo que esperávamos, não seguimos os passos que acreditávamos em nossa juventude que iríamos seguir. E quando estes personagens se veem de volta no tempo é quando se deparam com os sonhos que não foram realizados, erros do passado que não foram corregidos, histórias que não foram devidamente terminadas. E é justamente por esses elementos que a quarta parte marca o momento mais maduro de "American Pie", mais do que isso, consegue se manter no mesmo nível que "O Casamento" e assim, sendo ao lado do terceiro filme, o melhor. Por isso que o tempo fez bem para a história, porque ela foi sendo aperfeiçoada.

Outra grande graça deste novo filme foi ter conseguido reunir todo elenco original. Mesmo que alguns apareçam em pontas especiais, a experiência de revê-los já vale o ingresso. E assim como a própria história, as personagens ganharam uma versão melhorada. Jason Biggs faz o Jim ser uma personagem patética, mas ainda assim engraçado e ao lado de Alysson Hanigan provam que ainda existe uma química adorável entre a dupla. A dupla Chris Klein e Mena Suvari também ganham bom destaque, não só pela trama mas por serem bons atores. Até mesmo Eugene Levy, que faz o pai de Jim, está melhor e mais engraçado. Entretanto, quem acaba se destacando ainda mais é Seann William Scott, que trás mais uma vez, uma atuação memorável, e faz de Stifler um personagem único, brilhante. Ainda vemos aqueles coadjuvantes clássicos, como a mãe do Stifler (Jennifer Coolidge), Nadia (Shannon Elizabeth), Jessica (Natasha Lyonne) e Sherman (Chris Owen), o Sherminator.

"American Pie: O Reencontro" tem seus erros. O excesso de piadas relacionadas a sexo, que poderão deixar muitas pessoas constrangidas, somadas a nudez que surge gratuitamente. E as cenas que parecem não ter muita coerência, uma junção de situações que são jogadas na tela sem a intenção de criar algo lógico. Mas é isso, um besteirol, que tem como único intuito entreter. Mas diferente de muitos filmes do gênero, não é do tipo, desligue o cérebro e vá em frente. É uma obra que respeita o público seleto que o admira, uma comédia de qualidade que ainda possui seus doces momentos de romance. Não recomendo para todos, é preciso gostar e não ligar para o que é politicamente incorreto. Para aqueles que vivenciaram a década de 90 e sentem falta dela!


NOTA: 8,5










segunda-feira, 30 de abril de 2012

Crítica: Jovens Adultos (Young Adult, 2011)


Em 2007, o cinema independente norte-americano conheceu uma tal de Diablo Cody, uma ex-stripper que acabou vencendo o Oscar de Melhor Roteiro pela comédia "Juno", sucesso de público e crítica. Ela, escreveu outros roteiros, mas acabou se perdendo em filmes como "Garota Infernal" e "Burlesque". O diretor de "Juno", Jason Reitman, que já havia sido consagrado pela comédia "Obrigado por Fumar" de 2005, conquistou o estrelato e diferente de Cody, realizou um outro grande trabalho, "Amor Sem Escalas", em 2009.

Quatro anos após o sucesso de "Juno", Diablo Cody e Jason Reitman retornaram com mais um novo projeto, "Jovens Adultos". Entretanto, o filme não alcançou as expectativas de todos, aqui no Brasil, fora simplesmente ignorado. Acontece que se em 2007, a dupla revitalizou o cinema independente, em 2011, eles destroem tudo o que este subgênero conquistou. Não chamo isso de burrice. Chamo isso de ousadia. De originalidade. 



por Fernando Labanca

O filme começa nos mostrando o monótono cotidiano de Mavis Gary (Charlize Theron), divorciada, vive num apartamento na cidade grande ao lado de sua cachorra. É escritora de uma coleção de livros destinados ao público jovem e adulto que já não faz mais sucesso. Até que vasculhando seus e-mails, vê que fora convidada por seu ex-namorado Buddy Slade (Patrick Wilson) para uma festa de comemoração do batismo de sua filha. Os dois namoraram na época do colégio. Época em que Mavis era a rainha, todos a admiravam e conseguia tudo o que queria. 

Convicta de que Buddy, na verdade está pedindo socorro por estar casado e com uma filha, Mavis viaja até sua pequena cidade natal, Minessota, para salvar a vida dele e reconquistá-lo, recuperando os anos de glória do colégio. O problema é que ninguém na cidade a vê como vencedora, assim como ela imaginava, muito pelo contrário, a recebem com um certo desprezo, e o único que a respeita acaba sendo Matt (Patton Oswalt), que estudaram juntos, mas era um nerd fracassado e assim como ela, se prende no passado, sempre com receio de encarar a triste realidade, a de que eles cresceram e já não são mais adolescentes. 


"Jovens Adultos", sem querer, acabou sendo vendido como comédia. Comédia dramática com o selo do Festival de Sundance. Isso porque tem em seus créditos, Diablo Cody e Jason Reitman. Acontece que o filme é bem diferente de tudo isso. Não é mais um filminho norte americano independente. Não é uma comédia. É na verdade um drama intenso, com uma trama melancólica. É um estudo profundo na mente desta incrível personagem chamada Mavis Gary, complexa, onde o roteiro arma situações inusitadas afim de justamente estudar esta mente com personalidade desprezível e com sérios problemas psicológicos. Ainda há humor, com referências a cultura nerd, cheia de boas sacadas e muito sarcasmo e cinismo, mas diferente dos outros trabalhos da dupla, aqui o alvo não é a excentricidade de uma sociedade, o alvo é sua protagonista, nos revela de forma assustadora suas manias, suas falhas, seus medos, mesmo que nem ela seja capaz de enxergá-los. 

E o filme vai causar certo estranhamento naqueles que assistem. Mavis não é a heroína da história, muito menos a mocinha. É tudo muito bizarro a trajetória desta protagonista, a risada vem pela vergonha alheia e o mesmo ocorre com o nosso coadjuvante, Matt. É engraçado como ela enxerga sua vida, jamais conseguindo compreender o quanto ela falha, o quanto seus atos não fazem o menor sentido. Ao mesmo tempo, não conseguimos achar graça de nada disso, pois é tudo muito melancólico, vê-la a ponto de cometer grandes erros, vê-la acreditar que os anos do colégio ainda permanecem, que as atitudes de uma garota fútil, esnobe, amarga ainda podem fazê-la conquistar seus sonhos, vê-la desprezando uma vida de família, casamento, filho, como se esta fase marcasse o verdadeiro fracasso de uma pessoa. Assim como Matt, que se prende em seus objetos e brinquedos de adolescente nerd, que se fecha em seu mundinho, tudo por seu fracasso no passado, que não teve o direito de ser visto como herói nem mesmo quando virou deficiente. Como se a vida não tivesse mais espaço para eles. É triste notar que os anos passaram. É exatamente isso que "Jovens Adultos" retrata, os anos que ficaram para trás e o quanto é difícil aceitar que crescemos, encarar as responsabilidades da vida adulta e o dilema que os protagonistas enfrentam, se jogar na chatice de ser responsável ou se prender na felicidade artificial dos anos do colégio.

O roteiro de Diablo Cody beira a genialidade. Quando escrevi que ela havia destruído o que "Juno" havia construído, era justamente por conseguir quebrar os estereótipos das comédias independentes. Em "Juno" e em todos os outros filmes do gênero, todos os problemas eram resolvidos, tudo acontecia de forma agradável e com uma música indie alegre no fundo. E este universo, Cody e Reitman ajudaram a consolidar e para minha surpresa são os mesmos que resolveram quebrar com tudo isso. Em "Jovens Adultos", a dupla mostra uma outra faceta do cinema independente, com uma história dramática, com grande carga psicológica, sem músicas alegres, sem final feliz, sem lições de moral e protagonistas vencendo os próprios medos e aprendendo com seus erros. Mavis Gary é uma revolução. É a anti-heroína. E Jason Reitman soube mais uma vez traduzir as idéias de Diablo para as telas, em cenas frias, monótonas, tão amargas quanto a mente de Gary. 

Se em "Juno" foi seu grande roteiro que ganhou destaque, em "Jovens Adultos" é sua protagonista que ganha maior notoriedade. A verdade é que Charlize Theron consegue ser maior que tudo isso. Maior que o roteiro. Maior que as belas sacadas. Maior que a direção de Reitman. "Jovens Adultos" poderia muito bem ser resumido em duas palavras: Charlize Theron. Ela é o filme. Consegue com perfeição nos mostrar esta personagem de ouro, a sua imaturidade, sua falta de senso, de noção, seu jeito de adolescente bagaceira, de adulta que se recusa a crescer. Uma atriz talentosa que prova em cada diálogo ser uma das melhores da atualidade, é simplesmente fantástico o que ela realiza aqui, além de "Monster" e "Terra Fria", este filme marca um grande momento de Theron nas telas. Ainda temos um grande coadjuvante, o desconhecido Patton Oswalt, que também surpreende. No elenco, ainda nomes como Patrick Wilson e Elizabeth Reaser, corretos. 

Um filme ousado, que foge do convencional, que foge daquilo que esperamos dele. O problema é que ele foge para um lugar não tão agradável assim. Ás vezes é difícil acompanhar a trama, tudo é muito melancólico, lento, monótono, o que faz com a grande idéia de Cody perca a força. E os conflitos nem sempre são resolvidos da melhor maneira e há cenas que se não fossem o poder de Theron poderiam ter sido descartadas. Faltou ritmo e uma intenção de transformar o longa em algo mais memorável. É um projeto ousado por suas inovações, mas infelizmente parece pequeno, onde a protagonista é muito maior que a própria história. Ainda assim, vale a pena, aliás, não é sempre que temos a chance de conferir um filme como este, que vai além do que já foi feito. 

NOTA: 8


sexta-feira, 27 de abril de 2012

Crítica: Shame (Shame, 2011)

"Shame" entrou para a lista dos ignorados no Oscar 2012. Trás para as telas, pela direção de Steve McQueen, a conturbada rotina de um homem viciado em sexo. Acredito que a temática o tenha afastado das grandes premiações, logo que vemos um grande filme, ousado em sua proposta e se mostra para o público sem medo de assustar ou criar polêmicas, além de ter em cena dois grandes atores em belíssimas performances, Michael Fassbender e Carey Mulligan.

por Fernando Labanca

Conhecemos Brandon (Fassbender), aparentemente um homem comum, trabalhador que vive em Nova York e mora sozinho em seu apartamento. Entretanto, por de trás desta fachada, existe seu segredo. O seu vício. O sexo. A louca obsessão que ele tem por sexo. Faz por prazer e nunca por amor, tem uma eterna sede de se relacionar com alguém, não importa quem e nem quando. Tem problemas em seu computador pelos virus recebido ao entrar em sites pornográficos, não perde tempo em se masturbar nas horas vagas e em sua vida noturna, vai atrás de sua caça.

Tudo muda com a chegada de sua irmã, Sissy (Carey Mulligan). Ela é suicida, sente um eterno vazio em sua vida e nunca encontra algo para preencher. Passa a conviver diariamente no mesmo apartamento que Brandon, sem planos para ir embora e assim, ele se depara com a invasão de sua suja privacidade, Sissy passa a interferir em sua rotina e abala completamente seu mundo de sexo, pornografia e estranhas obsessões, o fazendo ir ainda mais fundo em sua loucura, se tornando vítima de seu próprio vício.

"Shame" é provocador. É agressivo. É ousado. É o típico filme para se ver sozinho, admirar em sua privacidade. É quase que constrangedor dividí-lo com alguém. Há inúmeras cenas de nudez e sexo e isso pode incomodar os mais conservadores. Por outro lado, elas aparecem com intuito, com propósito, não é obsceno e muito menos apelativo, faz parte da proposta, que aliás, o roteiro, também assinado por McQueen, consegue com competência nos mostrar este universo de Brandon, entramos neste mundo sujo, vivenciamos naqueles minutos a intensidade daquela rotina. A nudez, por sua vez, surge naturalmente, sem querer ser sensual, apenas abre a porta daquele simples apartamento e vemos aquelas personagens em seus cotidianos. E assim, "Shame", foge completamente do convencional, além da trama um tanto quanto inovadora, a maneira como McQueen guia este roteiro é tão fascinante, prende a atenção mesmo quando nada acontece. E apesar da tal agressividade, o longa também consegue ser sensível, de forma sempre madura, há cenas deliciosas de puro diálogo, por vezes cômicas, outras, dramáticas. Como por exemplo, o divertido relacionamento entre os irmãos, que ocorre de forma simples e extremamente espontânea. 

Por outro lado, este roteiro apresenta suas falhas. O filme despe suas personagens, mas isso, infelizmente, não ocorre de forma literal. Apesar de conhecermos a privacidade de Sissy e Brandon, nunca sabemos ao certo quem eles são. O que a irmã faz no apartamento dele, qual a causa de sua depressão e talvez o mais intrigante, o que realmente existia entre os dois. A relação dos irmãos causa um certo estranhamento, a liberdade que um tem com o outro, a raiva que sentem entre eles, e por vezes há algo que remete a uma relação incestuosa, desde a aproximação quase que carnal e o ciúmes que surge em uma das cenas, além do repentino momento de choro de Brandon ao ver Sissy cantar, mesmo ele sendo tão insensível. Enfim, acontece que a história ocorre e ficamos que a parte de tudo, nunca sabemos o que de fato está acontecendo, justamente por não termos a chance de conhecermos as personagens ali retratadas. O filme nos faz acreditar que entramos na mais intima privacidade de Brandon, que conhecemos seus mais profundos segredos, mas não, em nenhum momento isso ocorre e quando acaba fica um certo sentimento de vazio. 

O grande destaque de "Shame", sem sombra de dúvida, é sua dupla de atores. Michael Fassbender é novo queridinho de Hollywood e a cada filme que faz prova o porquê. É um ótimo ator, dá um show na tela, se mostra confortável num papel difícil que exige muito mais que uma grande atuação. Seu momento mais marcante é exatamente no clímax do filme, ao transar com mais de uma mulher, numa cena cheia de cortes e desfoques, e é no olhar de Fassbender que nos prendemos, há um certo pedido de desculpas pela vergonha de sua vida, há um olhar desesperado que pede por ajuda, é simplesmente impactante. Carey Mulligan é uma coadjuvante de ouro, brilha de forma intensa, tem carisma e consegue criar uma personagem bem diferente do que a atriz já fez no cinema, desde suas expressões, seu jeito de agir e de falar, é uma outra mulher. Acredito que Muligan tenha conseguido com Sissy chegar a um outro patamar, é, definitivamente, uma atriz completa, que se entrega de forma ousada e espanta por sua incrível performance. E acredito que Steve McQueen tenha exposto no filme o melhor dos dois.

"Shame" apesar de ser um belo e ousado projeto, não chega a ser uma obra tão inesquecível e importante no cinema. Ser ignorado no Oscar, pode ter sido por esta tal ousadia, por não ser convencional, por ser completamente diferente do que a Academia está acostumada a premiar, entretanto, houve filmes muito mais completos entre os indicados. Porque "Shame" não é um filme completo, tem inúmeras qualidades, mas faltou alguns elementos para ter se tornado excelente. Acredito também que o roteiro tenha se esquivado de conflitos mais intensos, como seu final que acreditamos que enfim algo extremamente chocante aconteceria e não acontece, continua na mesma. Acaba que o filme dá uma volta, cheia de idéias, de cenas ousadas, de pura originalidade, mas volta ao ponto zero e termina da mesma forma que começou. Pois nada é revelado, nada é alterado, nada é concluído. Destaque para os grande atores, pela direção de McQueen e pela belíssima trilha sonora que eleva a qualidade da obra. No geral, um filme interessante e atraente, que possui seus erros, mas ainda assim prende a atenção, hipnotiza, que consegue provocar em seu público, sentimentos fortes que muitas vezes geram a emoção. Vale a pena conferir.

NOTA: 7,5


domingo, 22 de abril de 2012

Jogos Vorazes (The Hunger Games, 2012)

Desde que se percebeu que a saga "Harry Potter" infelizmente teria um fim, o cinema, mais precisamente, Hollywood, tentou investir em outros projetos que tivessem a mesma força do bruxo britânico, geralmente buscando suas fontes em adaptações de livros voltados para o público jovem e que tivessem sequências. Nisso, assistimos ao bom começo de "As Crônicas de Nárnia" até seu crescente fracasso. Vimos também o desinteresse de grandes estúdios em "A Bússola de Ouro" que para a surpresa de todos só teve um filme, além da aposta em "Percy Jackson" que não foi bem realizada e nem bem recebida pelo público. E, claro, o fraco, mas que acabou "dando certo", a saga Crepúsculo, que conseguiu manter seu público até o quarto filme. Pois bem, Hollywood ainda não desistiu. Surgiu então, nas livrarias, aquela trilogia que poderia trazer de volta o público jovem, "Jogos Vorazes", obra de Suzanne Collins. A adaptação ficou por conta da própria autora ao lado do diretor, Gary Ross. E assim fica a pergunta, "Jogos Vorazes" merece realmente toda essa atenção, toda essa aposta? Ao término do filme, compreendi. Sim, merece.


por Fernando Labanca

O filme nos leva para um futuro pós-apocalíptico distante, numa região conhecida como Panen. A região era dividida por 12 distritos, todos habitados por uma sociedade assustada e pobre. Viviam sob um regime totalitário comandado pela Capital, uma metrópole habitada por seres fúteis e bizarros. No passado, houve uma rebelião nesses distritos contra a opressão da Capital e como consequência deste ato, os poderosos opressores criaram uma espécie de reality show, colocando numa arena, assim como os antigos gladiadores, jovens entre 12 a 18 anos, onde cada divisão deveria oferecer um casal como tributo. Nesta arena, os 24 escolhidos deveriam lutar pela sobrevivência e para isso, deveriam matar seus oponentes. Como ninguém se oferecia, anualmente era feito um sorteio, é então que no 12º distrito, para salvar a pele de sua pequena irmã que fora escolhida, Katniss (Jennifer Lawrence) se coloca no lugar, enfrentando Peeta (Josh Hutcherson), o outro sorteado.

Um casal de cada distrito é lavado para Capital. Lá, eles conhecem um estranho mundo, cheio de mordomias e riquezas. Katniss e Peeta seguem com o auxílio de Haymitch (Woody Harrelson), um ex-sobrevivente que conhece as táticas para vencer no jogo, e logo os dois percebem que tudo é uma questão de saber se vender, pois haviam os ricos que patrocinavam os Jogos Vorazes e quanto mais gostavam do casal, mais os ajudariam na arena. Já no campo de batalha, Katniss, Peeta e todos os outros jovens, se enfrentam numa guerra onde os valores que aprenderam são completamente ignorados, seja como amizade, companheirismo ou até mesmo o amor, são confundidos como táticas de jogo, onde tudo o que importa é sobreviver, é vencer. Não importa quem perca, não importa quem morra.


Confesso que tinha um enorme preconceito com "Jogos Vorazes", não passaria de um filminho para adolescentes, com romances e um elenco com rostos bonitos. O que foi bom, pois minhas expectativas eram extremamente baixas. O que vi na tela foi um filme poderoso, com uma idéia promissora capaz de sustentar uma trilogia, cheio de boas sacadas e conflitos incrivelmente bem escritos que preencheram bem as duas horas e meia de duração. O futuro mostrado no filme foi trabalhado com certo primor de detalhes, seja naquela sociedade pobre dos distritos, criando toda uma nova cultura, seja na Capital, onde os figurinos e maquiagem assustam pela bizarrice, mas enchem os olhos pela originalidade. Tudo foi muito bem pensado, passamos a acreditar naquele universo, se torna real. Aliás, "Jogos Vorazes" conta com um roteiro raro, sem a necessidade de correr para mostrar as batalhas, sem a necessidade de grandes efeitos visuais e sem a necessidade de criar cenas forçadas de romance. Tudo ocorre naturalmente e nem por isso deixar de ser frenético, hipnotizante. 

A escolha da direção foi outro grande acerto. Gary Ross ("A Vida em Preto e Branco" e "Seabiscuit") realiza um trabalho notável, é belo o que o diretor faz deste filme. Já no início ele nos prova sua competência, desde os cortes bruscos, a incrível composição das cenas, enfim, contribuindo e muito para a qualidade da obra. Vale destacar os figurinos, a fotografia e a ótima trilha sonora de James Newton Howard. Aliás, há uma bela direção de arte, desde as locações, os cenários, fortemente influenciados pela Art Deco da década de 30, um visual futurístico retrô, pois é este o universo retratado, nada mais conveniente, um futuro regido por ordens passadas.  Mas a grande sacada do filme é sua idéia, a noção que eles passam daquele regime totalitário, a maneira como tudo acontece, as críticas da sociedade moderna, o vazio de uma guerra que parece nunca fazer algum sentido, o vazio também daquelas pessoas, fascinadas por moda e futilidades, a influência do poder, pessoas corrompidas por ele, se vendendo por ele, questionamentos sobre o que o ser humano é capaz de fazer para sobreviver, até onde ele carrega consigo seus valores, qual é seu limite. Cada pensamento, cada reflexão, inserida de forma madura, que respeita a inteligência de seu público, onde as personagens são colocadas em situações complicadas, que por vezes nos tira o fôlego, por outras nos mostram aquelas situações do tipo "o que você faria?", e assim o roteiro sempre procura seguir por caminhos não muito óbveis, provando a grande ousadia do projeto.

Ter Jennifer Lawrence como protagonista é o sonho de muitos diretores e produtores atualmente, e a atriz consegue mais uma vez provar o porquê de ser tão requisitada. Ela eleva o nível da produção, faz qualquer blockbuster parecer melhor, o que conseguiu fazer com "X-Men: Primeira Classe" e que faz aqui novamente. Talentosa, versátil, cumpre bem seu papel, mas vai além, não é simplesmente a mocinha corajosa, Lawrence tem posição, encarara a personagem, emociona nas cenas dramáticas e também convence na ação. Josh Hutcherson (aquele ator que parece crescer a cada filme que faz) foi uma boa escolha também, apesar de jovem, é veterano no cinema, já sabe o que faz e faz bem. Ambos surgem na tela com personagens raros, são complexos, possuem diversas facetas e surpreendem por suas atitudes, não são um mero casalzinho de filme adolescente, são melhores. Além deles, coadjuvantes interessantes, Woody Harrelson fazendo o que sabe fazer de melhor, o bêbado com cara de psicopata, Elizabeth Banks, quase que irreconhecível, e o jovem há muito tempo afastado do cinema, Wes Bentley. Além do veterano, Donald Sutherland e o sempre ótimo, Stanley Tucci. 

"Jogos Vorazes" merece toda a atenção que teve na mídia. Um filme que merece as apostas, tem potencial para ser uma grande saga, pelo menos se conseguir manter no grande nível deste primeiro. Uma obra surpreendente, que hipnotiza por seus acontecimentos, cheio de conflitos interessantes e bem desenvolvidos, com um roteiro brilhantemente bem escrito, que vai muito além de um filme para adolescentes, é um filme poderoso, com grandes idéias, que não subestima seu público, oferece algo de qualidade, que aposta na inteligência daquele que assiste. Um filme ousado, seja pelos elementos já citados, mas também pela violência, que surge de forma inesperada e de uma maneira quase nunca explorada pelo cinema, ousa tembém por seu final, definitivamente, muito longe daquilo que todo mundo esperava. Fantástico. Recomendo. Que venham mais "Jogos Vorazes". 

NOTA: 9






sexta-feira, 6 de abril de 2012

Crítica: Como Você Sabe (How Do You Know, 2010)

James L.Brooks, que em 1997 realizou sua obra-prima "Melhor é Impossível", retorna em 2010, com filme lançado ano passado aqui no Brasil, a comédia romântica "Como Você Sabe", trazendo de volta o que o roteirista sabe fazer de melhor, a originalidade de seus diálogos e a inusitada composição de seus excêntricos personagens. Muitos apontaram como o grande fracasso de sua carreira como autor e diretor. Vejo diferente. Vejo como um filme incompreendido pelo público e pela crítica, que não teve espaço justamente por não ser convencional e apostar em algo que o gênero nunca explora, a reflexão e a inteligência.

por Fernando Labanca

Começamos pela história, que de longe parece muito clichê, mas de fato, não é. Infelizmente pela sinopse não é possível compreender a originalidade da obra, devido a isso, o longa surpreende bastante. Reese Witherspoon interpreta a impulsiva Lisa, jogadora profissional de tênis, que nunca sabe o que quer exatamente de sua vida, mas segue em frente, mesmo assim. Namora um outro jogador, Manny (Owen Wilson), nada afetivo e que não filtra muito bem suas palavras. Lisa, por sua vez se questiona com uma amiga sobre a possibilidade de namorar alguém que não tenha a mesma vida que a dela, é então que é apresentada a George (Paul Rudd), um cara muito azarado que está passando por um momento difícil, levou um fora de sua namorada e seu nome foi levado na justiça graças aos erros de seu pai (Jack Nicholson).

Para mais azar de George, que conhece Lisa num péssimo dia e se torna então, um péssimo pretendente. Na mesma época, porém, Lisa é colocada de fora dos campos por seu técnico, perde seu chão, seu rumo, seus objetivos. Duas pessoas que se encontram e nada compreendem de suas trajetórias. É então que ambos se tornam grandes amigos quando descobrem que possuem algo em comum, a busca de um sentido maior para suas vidas. No entanto, Lisa encontra em Manny o que muitas vezes procurava, sua insensibilidade, além de ter em comum com ele sua incapacidade de amar.

"Como Você Sabe" aborda as dúvidas da mente humana. Como saber se tal pessoa é a que devemos escolher para o resto de nossas vidas? Como saber que estamos caminhando pelo caminho certo? Como saber se estamos encontrando o que queremos e não mais o que precisamos? O roteiro brilhantemente escrito por James L.Brooks explora com delicadeza e inteligência esses conflitos. É quase que impossível não se identificar com alguns dilemas vividos por algum dos personagens, tantos questionamentos, não só sobre as relações afetivas, mas também sobre o que estamos fazendo de nossas vidas, sobre nossas escolhas. A caracterização de Lisa é interessante, uma protagonista que não sabe o que faz, que não sabe onde ir, que se prende em frases clichês sobre superação, mas nunca consegue tomar uma atitude sem parecer fria ou impulsiva. Melhor ainda é ver que a trama não é sobre alguém perdido que se encontra, mas sim sobre alguém como todos nós, que permanece e permanecerá sem rumo, em busca de uma resposta que no fundo todos sabem a verdade, nunca virá. E como certa hora o filme coloca em discussão, não é sobre descobrir o que se quer da vida, é sobre saber como pedir, como ir atrás daquilo que almejamos.

Assim como todos os filmes de James L.Brooks, algumas cenas surpreendem. É comédia romântica, dificilmente assistimos esperando algo inusitado, algo que fuja do convencional. E este é o maior triunfo do filme, fugir do lugar comum, usa uma premissa até que simples, o coração da moça dividido por dois homens, não havia como não subestimá-lo. Eis que ele nos surpreende. Surge na tela, sequências tão originais quanto belas. Foi bizarro e ao mesmo tempo interessante ver Lisa chorando enquanto lia suas frases manjadas no espelho escovando os dentes, ou vê-la abrir seu coração, revelando sua incapacidade de encontrar sentido naquilo que todas as mulheres encontravam, como amar, casar e ter filhos, um diálogo nada menos que complexo e de extrema sensibilidade. E mais uma vez, a originalidade de Brooks se encontra nos incríveis diálogos, seja nos mais humorados, seja nas belíssimas declarações de amor, que assim como "Melhor é Impossível" supera inúmeros filmes românticos, mesmo se tratando de uma comédia. Como as últimas declarações de George a Lisa, é simplesmente de cortar o coração, como há muito tempo eu não via. Foi ótimo ver, numa época em que fazer filmes românticos se tornou clichê, que ninguém mais é capaz de fazer o público suspirar por um diálogo entre duas pessoas apaixonadas, algo inteligente, comovente e original, que utiliza de inúmeros recursos, menos do que já foi usado pelo cinema. Uma comédia, para rir e pensar. Pronto, já é um tempo válido, pois é algo muito raro em Hollywood.

James L.Brooks como roteirista, o colocaria entre os grandes gênios do cinema atual. Entretanto, como diretor, ele se perde. Há cenas fracas, que mesmo com grandes atores em cena interpretando grandes personagens, é nítido a má qualidade de inúmeras sequências. Por vezes, me sentia diante daquelas cenas deletadas que encontramos nos extras de qualquer DVD, sem ritmo, sem nada que empolgue, só o que vemos são motivos para terem sido facilmente deletadas. Mais uma razão para isso é sua longa duração. Os conflitos poderiam ser mais concisos, há muita coisa que se estende sem a necessidade e muitas cenas descartáveis, como quase todas de Jack Nicholson, onde os conflitos vividos por ele e Paul Rudd são tão chatos que não há como ter algum interesse nos problemas do pai e filho. Sendo a única coisa interessante entre eles, a resolução, que como tudo no roteiro, acontece de forma simples e bastante madura. Mas é válido citar que nem sempre Brooks erra como diretor, também há seus momentos que causam um certo interesse visual, auxiliado pela fotografia e a boa trilha sonora de Hans Zimmer.

O elenco é outro ponto positivo do filme. Reese Witherspoon soube passar muito bem os estranhos sentimentos de Lisa, suas oscilações e sua incompreensão da vida, com seu olhar vazio e distante, conseguindo se destacar muito bem nas variações de sua personagem, da comédia para o drama, e claro, seu grande carisma ajuda a nos afeiçoarmos a ela. Assim como Paul Rudd, sempre muito carismático e muito versátil em cena, entretanto, seu personagem só se torna interessante ao lado de Reese. Owen Wilson está até interessante, é o grande alívio cômico do longa e consegue arrancar alguns risos, fazendo sua atitudes patéticas parecerem normais, convence. Jack Nicholson quase que dispensável se não fosse sua grande atuação, mas tem lá sua importância na trama, mas é tudo muito chato. Outra coadjuvante que acaba surpreendendo é Kathryn Hahn, que não é importante na história, mas acaba se destacando.

"Como Você Sabe" começa com inúmeros defeitos e prometendo ser uma grande bomba. História até certo ponto desinteressante, diálogos fracos e humor que em nada agrada. É então que ele cresce, os personagens mostram suas verdadeiras intenções e o roteiro surpreende com diálogos e situações raras no gênero comédia romântica. Quando ele termina há um sentimento que poucas vezes senti diante de uma comédia, estive, definitivamente, diante de algo maior do que parece, que faz pensar pelas ótimas frases de efeito, que faz refletir por inúmeros questionamentos um tanto quanto complexos para o gênero, sem querer ser dramático ou exageradamente existencialista e faz emocionar como poucos filmes românticos conseguiram. Existem erros, existem. Porém, a obra é de uma raridade tão grande que vale e muito a pena conferir. Se para muitos críticos, James L.Brooks "perdeu a mão" aqui, ainda torço para ele continuar o mesmo, porque mesmo realizando este tal fracasso de sua carreira, ele conseguiu ser muito melhor que qualquer diretor e roteirista que circula por Hollywood.

NOTA: 8,5


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