quarta-feira, 5 de junho de 2013

Crítica: Faroeste Caboclo (2013)

Quem um dia ouviu Faroeste Caboclo, canção que marcou a trajetória da banda Legião Urbana, e pensou consigo mesmo...isso daria um bom filme? Sem refrão, a música constrói a história de um personagem, sua vida, com começo, meio e fim e durante anos a ideia de levá-lo aos cinemas não conseguira sair do papel, eis que depois de tanto tempo desde os primeiros boatos, finalmente chega esta tão aguardada adaptação, dirigida pelo estreante René Sampaio, que longe de querer fazer um videoclipe estendido, consegue elaborar um filme extremamente bem feito, ousado e poético.

por Fernando Labanca

Não tinha medo tal João de Santo Cristo (Fabrício Boliveira), que após perder a mãe pela seca do local e seu pai que morreu por um tiro de um soldado, decidiu deixar o marasmo da fazendo só pra sentir no sangue o ódio que Jesus lhe deu. Sabia que ali não era seu lugar e que havia coisas na vida que jamais poderia fugir, pois nem tudo era uma questão de escolha. Foi para Brasília atrás de um tio bastardo, seu nome era Pablo (César Troncoso) e lhe deu algumas oportunidades, começou a trabalhar como aprendiz de carpinteiro, mas seu tio peruano tinha outros planos, a maconha e ele passou a ser seu principal vendedor e logo logo os maluco da cidade souberam da novidade, causando a fúria em Jeremias (Felipe Abib), um traficante de renome que decidiu que com João ele ia acabar. Em uma fuga da polícia, João acaba conhecendo Maria Lúcia (Ísis Valverde), filha de um senador, é ela quem acaba mudando seus planos, ou pelo menos, é ela quem lhe dá motivos para suas próximas ações, ele se apaixona, lhe faz promessas de um futuro, o que João não esperava, porém, é que Jeremias há muito tempo era apaixonado pela garota, crescendo ainda mais a rivalidade entre os dois.


"Faroeste Caboclo" pode decepcionar os fãs da canção que esperavam uma adaptação mais fiel. A verdade é que o roteiro não segue a risca as palavras de Renato Russo, a liberdade narrativa os possibilita traçar novos rumos, ignorando passagens, reforçando outras, simplificando alguns acontecimentos e dando mais intensidade em alguns detalhes onde na música não era possível, como o cenário, seja a seca de Santo Cristo ou a musicalidade de Brasília na década de 80, dando espaço também, para a relação dos protagonistas, João e Maria Lúcia, que aqui ganham maior destaque, sendo este o foco principal da trama, uma maneira que o roteiro encontrou de justificar os acontecimentos finais, onde ao percebemos o intenso amor entre os dois, compreendemos suas atitudes e a maneira trágica como alguns conflitos são resolvidos em seu final. Esta liberdade, no entanto, não consigo ver como erro, muito pelo contrário, vejo como um ato corajoso e ousado daqueles que o realizaram, entregando não só um filme para os fãs, entregando um filme original, que foge daquilo que esperamos, com estilo próprio, sem querer ser um videoclipe, as referências à canção surgem sutilmente, nos trás uma trama realista, mostrando o Brasil daquele momento, seja através de sua música ou de seus problemas sociais, isso sem deixar de ser entretenimento, construindo um verdadeiro faroeste, digno de nosso país, com direito a dois rivais, uma mocinha e muitos conflitos a serem resolvidos, cara a cara, com uma arma na mão em um cenário desértico. Ainda há muito sexo, drogas e violência, que pode surpreender os desavisados.

Por outro lado, o fato de se distanciar da canção, me fez ter a sensação de que às vezes a música dizia mais, mesmo tendo um espaço e tempo muito mais amplo para retratar a trama de João de Santo Cristo, chega um momento em que o roteiro se torna repetitivo, como as brigas do casal e o constante retorno do protagonista ao mundo das drogas, como se já não mais tivesse o que contar, eles começam a prolongar momentos desnecessários. Ou até algumas passagens que na canção são tão mais grandiosas, como seu final épico e aqui no filme é tudo menor, de menos impacto, mais seco, mais distante. São nesses momentos, porém, que a direção de René Sampaio mostra sua força, não deixando o longa perder seu bom ritmo e se negando a todo instante a nos entregar uma cena ordinária, optando sempre pela melhor forma de se contar a história, construindo belas sequências e extraindo o melhor de seu elenco. A fotografia de "Faroeste Caboclo" é um show a parte, assim como a interessante trilha sonora, tanto a instrumental inserindo emoção e delicadeza às cenas como as músicas que retratam bem a época e nos presenteia com ótimas canções do bom e velho rock nacional e internacional também.

O ator Fabrício Boliveira é outro grande destaque de "Faroeste Caboclo", trazendo em seu olhar a angústia de uma vida sofrida, a fúria diante de seu inimigo e o amor que sentia por Maria Lúcia, diz muito sem nem ao menos dizer, ele é a alma do filme, trabalho admirável. Ísis Valverde também não decepciona, é seu primeiro trabalho no cinema e se entrega como se já o conhecesse, sua personagem é difícil e seu esforço em fazer o melhor é nítido. Felipe Abib constrói um Jeremias interessante e realiza boas cenas, assim como os outros coadjuvantes como Antonio Calloni, Marcos Paulo, César Troncoso e Rodrigo Pandolfo. 

Por fim, "Faroeste Caboclo" é mais um bom exemplo do que há no cinema nacional, claro que ao seu final bate um sentimento de que poderia ter sido melhor, mas é natural para quem conhece e já ouviu milhões de vezes a canção, era impossível não se ter uma expectativa alta, no entanto, é belo o que realizaram, a coragem de fazer a adaptação, a ousadia do roteiro, o esforço do elenco e da direção, onde a essência da canção é a mesma, a poesia, os sentimentos. É válido destacar que o grande trunfo da obra foi conseguir escapar das armadilhas que a música original pudesse provocar, tendo vida própria, conseguindo aprofundar sua trama, trazendo complexidade a seus personagens, desvendando o que na música não foi possível explicar. A ideia de levar a canção aos cinemas já foi uma grande sacada e seu resultado final pode decepcionar ou surpreender muita gente, porém, é inevitável não perceber a grande qualidade da obra. Recomendo!
  
NOTA: 8 



2 comentários:

  1. Amei o filme mas odiei o final !!!!! Mas td bem o filme é muito bom recomendo

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  2. Agora que eu vi o trabalho de Cesar Troncoso, conheci-o para a série O Mesmer e eu acho que é um excelente ator

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