Desde quando li as primeiras notícias sobre o musical que Clint Eastwood dirigiria, tive meus receios. O veterano que já realizou grandes obras resolveu arriscar no gênero que é tão improvável em sua carreira, tão distante daquilo que ele construiu até aqui. E esta é a beleza de "Jersey Boys", esta é a beleza de seu mais novo trabalho, se arrisca e nos presenteia com este filme que é tão diferente, não um mero musical, é um drama competente, um filme digno de Eastwood.
por Fernando Labanca
Baseado no musical da Broadway, "Jersey Boys" revela a trajetória da banda Four Seasons, que fez sucesso nos anos 60. Descobrimos como os quatro membros, Frankie Valli (John Lloyd Young), Tommy DeVitto (Vincent Piazza), Bob Gaudio (Erich Bergen) e Nick Massi (Michael Lomenda) se reuniram para a formação do grupo. Frankie, desde jovem, foi conhecido em seu bairro por seu talento na música, chamando atenção, inclusive, do mafioso Gyp DeCarlo (Christopher Walker), com quem Frank jamais acreditou precisar, até que anos depois, com o sucesso de sua banda, os dois se reencontram devido às grandes dívidas criadas por Tommy. "Jersey Boys" é sobre como o grupo conheceu a fama, mas também sobre como eles conheceram a decadência, parte pelo temperamento difícil e das irresponsabilidades de Tommy DeVitto, mas principalmente, pela busca de cada um, seguindo seus interesses pessoais.
Mesmo sendo baseado numa peça musical, Clint Eastwood decide fazer diferente, onde apesar das musicas, pouco podemos definir "Jersey Boys" como um musical, está mais para uma cinebiografia, ainda que o diretor e seus roteiristas reneguem todas as fórmulas e estereótipos do gênero. Esqueça aqueles velhos clichês de busca pela fama/acenção/decadência/redenção, brilhantemente, a obra constrói personagens tão únicos que permitem este escape, permitem que a trama siga outros rumos, seus próprios passos, é então que vemos as mãos de Clint, que prova não estar interessado no espetáculo, nos holofotes, compreendeu a necessidade de revelar quem são os verdadeiros membros do "Four Seasons", colocou estes grandes personagens à frente das canções, do exagero, como o próprio filme em certo momento diz: "se enfeitar demais fica brega". E realmente fica. "Jersey Boys", diferente das grandes adaptações da Broadway nos cinemas, se dedica muito mais na construção de sua trama do que no esforço em se colocar na disputa por um Oscar.
Clint Eastwood, que é um admirador do Jazz e já compôs algumas trilhas de seus filmes, prova na tela, enfim, este seu amor pela música. E é nítido isso. Se de início pareceu bizarro sua escolha em dirigir este projeto, ao seu fim, não resta dúvidas de que acertou e muito. Se trata de uma obra menor do diretor, ainda assim, esta sua paixão por aquilo que expõe transforma "Jersey Boys" em um filme encantador, divertido até e muito único, distante do que conhecemos de Clint e distante do que o gênero já mostrou até aqui. Ao utilizar a arriscada quebra da quarta parede, temos a sensação de conhecer ainda mais seus personagens e esse recurso dá um tom um tanto quanto mágico ao filme e isso lhe faz bem. Achei genial seus instantes finais e como cada um dos protagonistas conta sobre si mesmo, é quando percebemos que cada membro do grupo havia enxergado esta jornada de forma diferente, nada melhor que isso para ilustrar a verdadeira trajetória que viveram, onde cada um tinha seu próprio interesse, onde, por fim, o passado que narram para o público nada mais é que uma história contada para alimentar seus egos.
Outra grande escolha do diretor foi na escalação de seu elenco, profissionais que vieram diretamente da Broadway. Ver rostos desconhecidos fez bem para a trama, mais do que isso, ter em cena atores competentes e que cantam muito bem, entregando performances naturais e gostosas de se ver e ouvir, diferente de muitos outros musicais já feitos. John Lloyd Young, por sua vez, já havia interpretado Frank Valli no musical original, que aliás, ainda venceu o Tony Award por sua atuação, causa um certo estranhamento de início por sua voz aguda, mas faz parte, realizou um ótimo trabalho. Destaque da obra, porém, fica para Vincent Piazza, que tem sua carreira mais conhecida na TV, diverte fácil com seu Tommy DeVitto, domina seu texto e entrega grandes cenas. Christopher Walker é o nome mais conhecido do elenco, e apesar de ser uma pequena participação, está incrível.
"Jersey Boys" também possui uma produção cuidadosa, desde os figurinos e cenários, tudo muito bem construído e apesar de contar com uma direção mais contida de Clint Eastwood, vemos na tela uma obra interessantíssima, digna de admiração. O desenvolver da trama, por vezes, é um pouco lento, até cansa em alguma passagens, devo confessar, isso ocorre também por sua longa duração, o que faz com que cenas sem muita importância ganham espaço no filme, ou alguns núcleos que não são muito bem aproveitados pelo roteiro, como a família de Frankie Valli. Entretanto, tive a sensação que a obra vai ganhando força ao seu decorrer, e isso é bom, vai se tornando melhor, os personagens vão crescendo e a qualidade da película parece só aumentar, alcançando seu ápice em seu final. E que final! Terminei a sessão com um sorriso enorme no rosto, a maneira com Clint finaliza sua obra é de uma beleza e originalidade tão grande que me fez querer ficar ali, sentado, esperando por mais. Recomendo.
NOTA: 9
OBS: Depois de Dreamgirls - Em Busca de Um Sonho (2006), Hairspray - Em Busca da Fama (2007) e agora com este, me pergunto qual será o brilhante título para o próximo musical lançado aqui no Brasil.
Duração: 134 minutos
Distribuidor: Warner Bros.
Elenco: Vincent Piazza, John Lloyd Young, Erich Bergen, Michael Lomenda, Christopher Walker
Diretor: Clint Eastwood
Roteiro: Marshall Brickman, Rick Elise
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