por Fernando Labanca
Para quem acompanha a carreira do diretor, sabe que a cada novo trabalho o cenário é um ponto muito importante para suas histórias, funcionam quase como um novo personagem, assim foi com Barcelona em "Vicky Cristina Barcelona", Londres em "Match Point" ou Nova York em "Annie Hall". O palco desta vez é Paris, a cidade das luzes, o lugar dos apaixonados, onde o diretor e roteirista parece ter encontrado uma fonte rica de inspirações.
O escolhido para viver o Woody Allen da vez foi Owen Wilson, que interpreta Gil Pender, um escritor que trabalha para Hollywood, o que lhe causa uma certa frustração pois acredita não colaborar muito para a arte e a verdadeira literatura, com isso, passa por um certo bloqueio criativo para criar seu mais novo projeto, até que para aliviar a tensão viaja ao lado de sua noiva, Inez (Rachel McAdams) e os pais dela (Kurt Fuller e Mimi Kennedy) para Paris, a cidade na qual ele tem uma grande admiração, não para de falar o quanto ele admira os autores da década de 20 de Paris, a época e local que ele adoraria ter vivido, a cidade sob a chuva, as luzes da noite e toda aquela vida cercada por cultura e cercado pelos gênios que hoje só se conhece nos livros de história.
Até que certa noite, convidado por estranhos a entrar num carro antigo, Gil se vê rodiado por figurinos de outra época, é quando chega em uma grande festa e se dá conta que o carro o levou para realizar seu grande sonho, viver a década de 20. Lá, ele conhece seus ídolos, Ernest Hemingway (Corey Stoll) que lhe apresenta a mulher que colabora com sua obras, Gertrude Stein (Kathy Bates) que também passa a auxiliá-lo no seu projeto, além de ter contato com F.Scott Fritzgerald (Tom Hiddleston) e ver de perto a conturbada relação com sua mulher, Zelda (Alison Pill). É onde também conhece Adriana (Marion Cotillard), uma estudante de moda e musa inspiradora de artistas como Picasso e Georges Braque, que logo se apaixona por ela, o que acaba complicando sua vida, e se vê dividido entre viver o presente ou o passado, além de todo este ambiente nostálgico lhe fazer refletir sobre suas escolhas, sobre sua vida e seu trabalho.
Assim como Gil certa vez comenta em sua viagem, que a arte é o antídoto para a realidade, é aquilo que as pessoas usam como forma de escape, Woody Allen leva essa teoria ao pé da letra, ao colocar um personagem tão insatisfeito com sua vida, numa época onde ele sempre acreditou encontrar seu verdadeiro "eu", no caso, na Paris da década de 20. A cidade, então, se torna palco de uma fantasia, nada menos que deliciosa e criativa, e assim como em outros trabalhos de Woody, ele consegue mais uma vez inserir fantasia na realidade de forma natural, sem parecer forçada, e o resultado é mais do que positivo, o roteiro nos teletransporta para a época junto com Gil, e o cinema de Woody Allen em "Meia Noite em Paris" cumpre sua mais importante e crucial função, nos fazer viajar, fantasiar, nos fazer esquecer durante alguns minutos, por completo, da nossa realidade, nos faz querer estar ali, presenciar aquilo.
A história me surpreendeu, nunca havia lido muito sobre a obra, o que foi ótimo, pois a literal viagem de Gil Pender me fez viajar junto e admirar cada detalhe mostrado na tela. Ver Picasso como um ser humano normal, Salvador Dali na impecável atuação de Adrien Brody, exatamente como o lunático como o conhecia nos livros, além de outros que conhecia somente por obras como Henri Matisse, Scott Fritzgerald e Luis Buñuel como se fossem pessoas normais passeando em Paris. É divertido, original e querendo ou não, hipnotizador. É interessante alisar toda essa idéia e ver que hoje muitos pensam da mesma forma, quantas pessoas já me disseram "queria ter nascido em outra época", este tipo de comentário é muito comum, é exatamente isso que Woody Allen questiona em seu trabalho, o porquê da realidade nunca ser o suficiente, por que as pessoas sempre acreditam que seriam mais felizes se estivessem em outro tempo.
Como todo trabalho de Woody Allen, não espere uma grande reviravolta no final, ou um final surpreendente, a história mais uma vez é linear, com a presença de alguns pontos que vão alterando o caminhar dos acontecimentos, mas sem um clímax. É de se esperar um clímax em qualquer filme, mas vindo de Allen, já é de se esperar que não tenha, então meio que este fato não decepciona tanto. Dessa vez, o diretor caprichou em outros elementos, como locações e figurinos, consegue com perfeição mostrar cada época ali retratada, o que faz dessa "viagem" ser mais prazerosa. A trilha sonora é a mesma de sempre.
Ver Owen Wilson como protagonista havia muito tempo que não era tão bom. O ator se mostra bastante habilidoso no texto de Allen, devido a sua ótima performance a comédia acontece, ele nos mostra através de suas expressões toda sua admiração, loucura, felicidade e paixão por presenciar tudo aquilo e graçás a isso, a brincadeira funciona. Marion Cotillard é sempre fantástica, está linda e bastante a vontade no papel. Rachel McAdams domina bem o texto também, tem presença marcante, mas numa personagem um tanto quanto incompreendida, é chata, e passa o filme inteiro reclamando, assim fica fácil demais imaginarmos o porquê de Gil ter se apaixonado por outra. Coadjuvantes de peso aparecem em participações como Adrien Brody, fantástico em apenas uma cena, Kathy Bates mais uma vez ótima, Michael Sheen sempre versátil, sempre mostrando uma nova faceta e sempre surpreendendo. Ainda há Tom Hiddleston, o Loki do recente "Thor", se mostrando uma ator promissor, contracenando com uma jovem atriz que vem chamando bastante a atenção, Alison Pill. E ninguém mais que Carla Bruni fazendo uma guia de um museu, pequena participação e que não altera o resultado.
"Meia Noite em Paris" marca sem sombra de dúvida, um bom momento da carreira de Woody Allen, é um filme fantástico que mostra o cinema em ótima forma, mostrando que ainda há espaço para obras de qualidade e que o talento deste diretor e roteirista não ficou no passado, é um gênio que consegue se reinventar a cada trabaho. Uma obra que não é feita somente de referências, há conteúdo, há uma história bem contada que prende a atenção, além de contar com a presença de um grandioso elenco. Recomendo.
NOTA: 9
+ Woody Allen
[Annie Hall, Todos Dizem Eu Te Amo, O Escorpião de Jade, Tudo Pode Dar Certo]
[Manhattan, Melinda e Melinda]
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe um comentário #NuncaTePediNada