Um dos indicados à
Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2012, “Ferrugem e Osso”
conta com uma delicada atuação de Marion Cotillard e narra de forma
impactante o encontro de dois personagens, que vivem em pontas
opostas, vivendo no limite de uma situação, ambos tentando se
adaptar a um mundo que desconhecem. Extremamente ousado e original,
um filme que surpreende ao não apelar para o romantismo, conseguindo
ainda despertar sensações em seu público, sendo assim, mesmo com
sua frieza, uma obra difícil de ser esquecida.
por Fernando Labanca
Alain é um bruto homem
que viaja com seu pequeno filho para viver na casa de sua irmã e
conseguir assim uma vida melhor, já que pouco tem para sustenta-lo.
Não demora muito, ele consegue um emprego como segurança de uma
boate, é lá que conhece Stéphanie (Marion Cotillard). Ela é uma
treinadora de baleias e em uma de suas apresentações acaba sofrendo
um acidente, perdendo suas duas pernas. Transtornada e sem saber
muito o que fazer, Stéphanie decide entrar em contato com Alain, a
partir deste momento, ele será o elemento que a fará aceitar sua
nova vida, aceitar suas limitações, enquanto que ela lhe dará
confiança para seguir um novo rumo em sua vida, ser um lutador de
rua, usando toda sua força para sustentar seu filho.
É difícil expressar
exatamente o que é este filme, dizer o que vi, o que senti. Talvez
ele seja do tipo que faz mais sentido assim que termina. A verdade é
que se trata de uma obra extremamente original, que trás ideias
novas e maneiras diferentes de se comunicar com o público. Poderia
ser um grande drama, a história da mulher amputada e do homem que
precisa sustentar sua família. Poderia ser um belíssimo romance
relatando o encontro desses indivíduos sofredores, mas não é. É
um filme que captura os conflitos de seus personagens sem a intenção
de romantizar, de buscar a emoção, ele é frio, nem por isso,
distante, é realista, é poesia que se nega a usar palavras fáceis
para expressar sentimento. Não procura entender a mente de seus
personagens, o que há por dentro de suas cabeças, vemos o que está
do lado de fora, vemos a maneira como eles usam para expressar o que
sentem, é no corpo que está a palavra, o corpo como escudo de uma
vida que evitam, é na perna que Stéphanie não tem que vemos sua
maior fragilidade, é nos músculos que Alain encontra sua maneira de
sustento, é na cabeça rachada de seu filho que ele demonstra o amor
que não consegue expressar, e é no sexo que eles se conectam, na
nudez que dizem quem realmente são. E o diretor Jacques Audiard
prova sua competência ao conseguir expor tudo isso, de forma crua,
ousada, em sequências visualmente fascinantes.
“Ferrugem e Osso”
narra também o encontro desses opostos, Stéphanie e Alain, ambos
tentando se adaptar a um universo do qual não faziam parte antes.
Ela, que após o acidente, precisa aprender a viver sem as pernas,
precisa readquirir o gosto pelas coisas, viver sentindo a ausência
de uma parte de seu corpo, daquilo que a compõe, enquanto que
incentiva Alain a ser um lutador feroz, desconstruindo seu corpo em
prol de seu sustento. E ao longo do filme, vemos esses indivíduos
enfrentando este processo de humanização, nem que para isso
precisam perder coisas pelo caminho, sentir na pela a dor que a vida
tem a oferecer. O que acaba chamando a atenção também para este
encontro é o fato de Jacques Audiard, e merece respeito por isso, se
desvincular do romantismo, a relação dos dois é fria, por vezes
parece até ser indiferente, é sexo, é descaso. E esta é
justamente a beleza da obra, fazer destes incríveis personagens
encontrar o afeto do qual precisam na fúria de suas ações, não
necessariamente na relação a dois, mesmo que no fundo, a presença
de um na vida do outro seja, nitidamente, importante, prova disso é o belíssimo diálogo final, tão real, tão sensível, e é neste momento em que ambos permitem que aquele muro de concreto que construíram para si se desmorone.
Os dois atores estão
fantásticos em cena, Marion Cotillard trás muita delicadeza a
composição de sua personagem, com certeza, um dos papéis mais
difíceis de sua carreira, seus olhares são profundos e dizem muito,
todo o seu vazio, sua solidão, sua garra, assim também é este
promissor ator, Matthias Schoenaerts que entrega uma performance
poderosa e digna de elogios. “Ferrugem e Osso” também oferece
uma direção competente de Audiard, que faz cada cena um momento
para se apreciar, desde a fotografia à composição de cada
sequência, chegando a ser hipnotizador. A trilha sonora composta por
Alexandre Desplat é outro ponto positivo, além das ótimas canções
selecionadas que embelezam ainda mais este filme. Para se ver e
admirar, uma obra marcante e extremamente corajosa. Recomendo.
NOTA: 9
País de origem: França / Bélgica
Duração: 120 minutos
Distribuidor: Sony Pictures
Elenco: Marion Cotillard, Matthias Schoenaerts
Diretor: Jacques Audiard
Roteiro: Jacques Audiard, Thomas Bidegain
Sabe, senti tudo isso que vc escreveu ao assistir este filme! Gostei demais!
ResponderExcluirTbm gosto muito deste filme!! E que bom que se identificou com o texto!
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