sexta-feira, 4 de abril de 2014

Crítica: Inside Llewyn Davis - Balada de Um Homem Comum (Inside Llewyn Davis, 2013)

Havia um tempo em que uma obra dos irmãos Coen passasse tão despercebida quanto "Inside Llewyn Davis", logo que são sempre lembrados pelas importantes premiações. De fato, não entendi, este filme em nada perde para outros títulos dos diretores. História simples, porém arrebatadora, que fala sobre a música folk enquanto nos revela a fracassada trajetória deste homem tão ordinário, digno de ser esquecido pelos outros mas que se torna memorável aos olhos dos Coen.

por Fernando Labanca

Antes de qualquer coisa, preciso admitir, nunca gostei dos filmes de Ethan e Joel Coen, não tenho um argumento forte para isso, mas acontece que suas obras de alguma forma não me tocam, algumas chego ao ponto de detestar como "Matadores de Velhinhas" e "Queime Depois de Ler", ou até obras aclamadas como "Bravura Indomita" não me agradam. Ainda assim, porém, toda vez que eles lançam algo me bate uma estranha curiosidade, mas no fim, sempre me decepciono. Acontece que nunca fui tão empolgado ver um longa da dupla quanto "Inside Llewyn Davis", talvez pela vibe folk e principalmente pelo elenco. Pois bem, pela primeira vez sai da sala do cinema com um sorriso do rosto após ver um filme deles. É, definitivamente, um filme fantástico, que merece uma chance, merece atenção, é algo a ser admirado.

Numa Nova York dos anos 60, caminha solitário este cantor fracassado de folk chamado Llewyn Davis, que vive da música, ainda que não tenha planos futuros e não tem a menor ideia aonde pretende chegar. Vive se deslocando entre apartamentos de amigos ou apenas conhecidos, sempre em busca de um teto para passar suas noites, sem nunca saber o que faria no dia seguinte, é então que sempre vai atrás de sua ex, Jean (Carey Mulligan), que está grávida e não sabe de quem é o filho, se de Llewyn ou de seu atual namorado Jim (Justin Timberlake), que também é cantor, porém muito mais promissor e mais bem sucedido. E indo atrás de gravadoras para conseguir uma carreira solo, já que seu ex parceiro se suicidou, Llewyn Davis acaba embarcando numa viagem com pessoas estranhas, ainda perdido, ainda sem saber aonde ir ou que realmente quer fazer de sua vida.


A fracassada jornada de Llewyn Davis. Joel e Ethan Coen, que também são responsáveis pelo roteiro, não dão chances a este cara, que de tão azarado nos faz sentir um misto de pena e vontade de rir, aquele conhecido "rir para não chorar", rimos de seu constrangimento, de sua desgraça. Ainda que o carisma de Oscar Isaac nos faça criar uma fácil afeição ao personagem, é impossível não sentir um certo incômodo e esta é a sensação que a obra nos deixa, o incômodo, ver a vida de alguém que nunca segue adiante, estagnado, mesmo que nunca conformado com sua situação atual, Llewyn de fato, nunca luta para sair do lugar, por conseguir algo melhor. Se existem momentos de nossa vida que são marcados pelas escolhas que não fazemos, a vida de Llewyn Davis acaba que sendo definida apenas por isso, por tudo aquilo que ele não fez. É a conhecida comédia dos erros tão bem consolidada pelos irmãos Coen, é engraçado, mas é também inevitavelmente triste, ver este homem jamais alcançando seu sucesso, é ainda mais triste enquanto ele canta, ao ouvirmos sua belíssima voz, a voz de alguém cansado, que canta as frustrações de sua vida, a voz que poderia ter dado certo no mercado. E parte da amargura e melancolia da obra vem justamente disso, de alguém que já não mais enxerga o folk como estilo de vida, como paixão, Llewyn Davis perdeu demais em sua jornada, o bastante para destruir sua paixão, o bastante para vê-la apenas como sustento.

O roteiro é certeiro. Genial é o que digo de sua introdução, Llewyn saindo de um apartamento e acaba deixando um gato escapar. Aparentemente parecia ser seu aquele local, ao vermos seu desespero pelo gato compreendemos de aquele gato não era seu, nem aquele apartamento, nem aquela vida. Gosto desta sutileza que se cria ao decorrer do filme, deixando que as imagens digam muito do que acontece ali, sem necessidade de narração em off, sem a necessidade de diálogos forçados, de arrependimento ou redenção. Muito pelo contrário, os irmãos Coen não dão chances ao protagonista, não há salvação para sua indiferença, não há esperança para sua melhora. E tudo isso é mostrado através de ótimos e naturais diálogos, e as cenas são construídas de forma tranquila, gostoso de ver e sentir, gostoso de apreciar cada instante. A fotografia faz sua parte, com suas cores frias, dizendo muito sobre Llewyn e muito sobre sua jornada, e principalmente sobra aquela época, o folk de Nova York, é então que se destaca todo o trabalho de produção, que recriaram aquela época, mais do que boas locações e figurinos, eles tiveram êxito em resgatar uma geração, uma cultura, uma história.


Como disse, as canções aqui são fundamentais, através delas conhecemos mais sobre este grande personagem, e foi um trabalho notável dos diretores que conseguiram reunir nomes da música como T Bone Burnett, que ao lado do próprio Oscar Isaac escreveu as canções, além de colaborações marcantes de Justin Timberlake e Marcus Mumford (de Mumford & Sons). É simplesmente fantástico o resultado final, Joel e Ethan Coen criam um ser fantasioso, relatam seu fracasso diante de um cenário musical tão bem estruturado, extremamente real, nos faz pensar nos tantos Llewyn Davis que existem, quantos sonhos que caminham paralelos a tantos nomes de sucesso. Da belíssima introdução de "Hang Me, Oh Hang Me", a empolgante "Please Mr.Kennedy" à profunda "The Death of Queen Jane", todas as canções funcionam, um musical, acima de tudo, muito estiloso e de muito bom gosto. Para apreciar ali e ouvir depois.

O elenco está sensacional, foi por eles que tive a curiosidade em ver o filme e valeu a pena ver este time reunido. Oscar Isaac em seu melhor momento, além de cantar muito e surpreender com sua potente voz, ele parece ter sido a melhor escolha para compor Llewyn Davis. Carey Mulligan dispensa comentários, ela já não tem muito mais o que provar e ainda assim se destaca com sua Jane, em mais uma grande atuação e que também solta voz em uma canção. O restante do elenco está ótimo, mas é de John Goodman a presença mais marcante.

Toda vez que me perguntavam qual era meu filme favorito dos irmãos Coen respondia qual eu achava o menos pior - ignorância total da minha parte -confesso. Mas como disse, nunca me agradaram. Pois bem, finalmente terei uma resposta nova, meu filme favorito dos irmãos Coen é "Inside Llewyn Davis: Balada de Um Homem Comum", pela história, pelo humor, pelo clima, pelas canções, pelo folk, pelo protagonista vivido com tanta verdade por Oscar Isaac. Recomendo.

NOTA: 9





País de origem: EUA
Duração: 105 minutos
Distribuidor: Paris Filmes
Elenco: Oscar Isaac, Carey Mulligan, John Goodman, Justin Timberlake, Adam Driver
Diretor: Ethan Coen, Joel Coen
Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen


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